Notícias do Congresso Internacional de Astronáutica
José Monserrat Filho *
# O 66º Congresso Internacional de Astronáutica, realizado em Jerusalém, Israel, de 11 a 16 de outubro, teve cerca de dois mil participantes, menos, portanto, do que o congresso anterior, em Toronto, Canadá, com mais de três mil pessoas. A situação política e os violentos conflitos em Israel e no Oriente Médio levaram muita gente a não comparecer ao tradicional evento, considerado o mais importante do setor espacial no mundo. A exposição de indústrias e agências espaciais foi menor. O número de brasileiros e latino-americanos em geral caiu bastante.
Ainda assim, foram debatidos alguns dos principais projetos espaciais da atualidade, como o retorno à Lua para criar assentamentos, a ida a Marte (agora mais animada com a descoberta de água) e a mineração dos recursos lunares e de asteroides por grandes empresas privadas, embora essa atividade ainda esteja longe de ser devidamente regulamentada do ponto de vista internacional.
# A Federação Internacional de Astronáutica (IAF), organizadora do Congresso, acolheu a Coreia do Norte (República Democrática Popular da Coreia) como seu mais novo membro. Ela será representada pela agência espacial do país, a Administração para o Desenvolvimento Aeroespacial Nacional (National Aerospace Development Administration – NADA), criada em 2013. A sigla em inglês é meio irônica, mas Tal Inbar, chefe do Centro de Pesquisa Espacial do Instituto Fisher de Estudos Estratégicos Aeronáuticos e Espaciais, situado em Herzliya, Israel, disse em Jerusalém à agência de notícias norte-coreana (NK News) que “a aprovação da NADA pela IAF “é uma decisão muito interessante” e está em linha com o empenho do governo de Pyongyang de “mostrar ao mundo as aspectos civis e pacíficos dos esforços espaciais norte-coreanos”.
Segundo a notícia assinada por Chad O'Carroil, jornalista inglês que trabalha entre Londres e Seul e escreve sobre a Coreia do Norte desde 2010, este país “afirma estar apenas desenvolvendo foguetes de longo alcance com fins pacíficos para o lançamento de satélites, mas muitos observadores acreditam que isso encobre o desenvolvimento não permitido de tecnologia de míssil balístico intercontinental”. Por isso certamente, a direção da IAF fez questão de deixar claro que “a admissão da agência espacial norte-coreana é de natureza puramente científica e não política”, frisou Inbar. Ele também contou que, em seu pedido de entrada na IAF, a NADA declarou que seu orçamento anual é de 102,5 milhões de euros – cifra bem menor do que o custo do lançamento de seu foguete Unha-3, em 2012, estimado – fora do país – em 850 milhões de dólares. As empresas e agências espaciais de todos os países costumam utilizar os Congressos de Astronáutica para promover suas realizações, programas e projetos – civis e militares. Vamos ver o que a NADA vai promover já no próximo Congresso em Guadalajara, México, em setembro de 2016.
# Os especialistas em Direito Espacial em geral têm vida longa. É o que se costuma dizer na comunidade espacial. Isso ficou provado mais uma vez com o 100º aniversário da Dra. Profª Isabella Diederiks-Verschoor, renomada mestre de Direito Aeronáutico e Direito Espacial, nascida nos Países Baixos (Holanda). Ela presidiu o Instituto Internacional de Direito Espacial durante muitos anos e lecionou em inúmeras Universidades, em Paris, Sydney, Canberra, Melbourne, Mississipi, Indonésia, Grécia, Montreal (Canadá). Dirigiu em seu país o Centro da Paz Mundial Através do Direito e escreveu vários ensaios e livros, entre os quais a famosa “Introdução ao Direito Espacial”, cuja primeira edição foi lançada em 1993. Como bem notou o Prof. Sephan Hobe, diretor do Instituto de Direito Aeronáutico e Espacial da Universidade de Colônia, Alemanha, a obra escrita por amigos e colegas em homenagem à Profª Diederiks não poderia ter um título melhor, “Air worthy”, que, numa tradução livre e apropriada, soa como “Dignidade no Ar”.
# A Dra. Elisabeth Back Impallomeni, Professora de Direito Internacional na Universidade de Pádova, Itália, e no Centro Europeu de Direito Espacial, bem como em várias universidades europeias, foi eleita Presidente de Honra do Instituto Internacional de Direito Espacial, depois de ter sido membro de sua diretoria durante vários anos. Ela também foi pesquisadora do mais alto nível na Faculdade de Direito da Universidade de Harvard, EUA.
# Uma nova e boa ideia do Colóquio promovido em Jerusalém pelo Instituto Internacional de Direito Espacial foi criar uma sessão com trabalhos sobre a relação entre filmes de ficção e as questões jurídicas espaciais neles presentes. O jurista Álvaro Fabrício dos Santos, ex-consultor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que hoje trabalha na Advocacia Geral da União (AGU) de São José dos Campos, São Paulo, não pôde ir a Israel, mas encaminhou um trabalho, que apresentei, como coautor, sobre a película AVATAR, de 2009, dirigida por James Cameron. É a história de um planeta detentor de valioso mineral, onde vive uma tribo de humanoides, que acaba sendo o principal obstáculo à mineração planejada por uma corporação privada vinda da Terra. O tema é super atual porque trata justamente da exploração comercial de recursos de corpos celestes, entre eles os asteroides. Vale a pena ver o filme de novo para prestar atenção a esse problema.
# O Instituto Internacional de Direito Espacial decidiu editar um “Annual Highlight Paper”, espécie de ensaio sobre um destaque anual. E acertou na mosca ao escolher o tema da primeira edição: o Tratado do Espaço de 1967, que completará 50 anos em 2017. Com um nome longo – “Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, Inclusive a Lua e Demais Corpos Celestes” –, é o código maior do espaço exterior e das atividades espaciais. Seu Artigo I estabelece a Cláusula do Bem Comum, nos seguintes termos: “A exploração e o uso do espaço cósmico, inclusive da Lua e demais corpos celestes, deverão ter em mira o bem e interesse de todos os países, qualquer que seja o estágio de seu desenvolvimento econômico e científico, e são incumbência de toda a humanidade.” O pessoal que vê o espaço só como fonte de negócios costuma dizer que tal princípio é apenas uma declaração moral, sem força jurídica. Essa visão está em alta vertiginosa na cotação dos mercados globais.
# O Prof. Sergio Marquisio, que leciona na Universidade la Sapienza, de Roma, e também dirige o Centro Europeu de Direito Espacial, com sede em Paris, recebeu o Prêmio do Instituto Internacional de Direito Espacial pelos Destacados Serviços Prestados ao Desenvolvimento do Direito Espacial e ao Próprio Instituto. Ele vai proferir, por Skype, a Conferência Internacional organizada pelo Núcleo de Estudos de Direito Espacial da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA), em novembro próximo, em data ainda por definir. Transmissão direta para os auditórios da SBDA, no Rio de Janeiro (coordenada por mim), da Universidade Católica de Santos (coordenada pelo Prof. Olavo Bittencourt), da Universidade do Oeste de Santa Catarina, em Joaçaba (coordenada pelo Prof. Alexandre Dittrich Buhr) e de outras instituições interessadas em entrar no circuito.
Tema da palestra: Por que o Direito Espacial é indispensável no Século XXI.
# O Juri Simulado Manfred Lachs, competição entre grupos de estudantes de Direito Espacial, tradicionalmente realizada pelo Instituto Internacional de Direito Espacial desde 1992, foi vencida este ano, em Jerusalém, pela equipe da Escola de Direito da Universidade do Mississipi, EUA. O prêmio de melhor Expositor coube ao jovem Athanasios Plexidas, da Faculdade de Direito da Universidade de Atenas, Grécia. As equipes da Nigéria e da Índia foram semi-finalistas. O Juri Simulado sobre casos espaciais tem alcançado grande sucesso nos Cursos de Direito dos EUA, Europa, Ásia e África. Nenhum país da América Latina, inclusive o Brasil, entrou até hoje na competição. Tudo indica que os motivos principais dessa não-participação são a ausência do Direito Espacial no currículo das Faculdades de Direito e o fraco domínio do inglês, língua em que se desenvolve a competição.
* Vice-Presidente da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA), Diretor Honorário do Instituto Internacional de Direito Espacial, Membro Pleno da Academia Internacional de Astronáutica (IAA) e Chefe da Assessoria de Cooperação Internacional da Agência Espacial Brasileira (AEB).
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