quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Carlos Gurgel: “Minha obra está concluída na AEB”

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“Minha obra está concluída na AEB”

O engenheiro Carlos Gurgel, diretor de Satélites, retornará para a Universidade de Brasília e faz um balanço de sua atuação na Diretoria de Satélites da Agência Espacial

André M. Mileski

O engenheiro mecânico Carlos Alberto Gurgel Veras, diretor de Satélites, Aplicações e Desenvolvimento da Agência Espacial Brasileira (AEB) desde setembro de 2012 deixará a agência no início de 2017. Com o intuito de apresentar um balanço de sua gestão, marcada por importantes avanços na área educacional, o dirigente conversou no início de dezembro com a reportagem de Tecnologia & Defesa.

“Minha obra está concluída na Agência”, diz Gurgel, que no primeiro trimestre de 2017 retornará à Universidade de Brasília (UnB), onde é docente. “Continuarei colaborando com o Programa Espacial por meio do curso de Engenharia Aeroespacial”, referindo-se à graduação oferecida pela universidade, hoje uma referência em formação de recursos humanos para o Programa Espacial.

Gurgel divide suas realizações na AEB em duas vertentes principais, uma tecnológica e outra educacional. No campo tecnológico, uma das mais importantes envolve a missão SABIA-MAR, um projeto de satélite de observação em conjunto com a Argentina, com a definição e conclusão da Fase A, de planejamento da missão, que contou com significativo envolvimento dos usuários dos dados que serão futuramente gerados pelo satélite.

Finalizada em dezembro de 2013, a Fase A foi concluída no prazo de 12 meses, representando a retomada do projeto binacional. “Envolvemos os usuários, as partes interessadas, e realizamos workshops no Brasil e na Argentina com a indústria e usuários.” A etapa seguinte se deu com a Fase B, que envolve maior detalhamento e a revisão preliminar. “Desengavetamos um projeto, e no final conseguimos momentum para que a missão siga de forma mais organizada.”

No campo educacional, por assim dizer, a gestão de Gurgel significou o início de um acompanhamento mais intenso por parte da AEB nas ações essenciais para a formação de recursos humanos e massa crítica para o desenvolvimento das atividades espaciais. “[Houve] uma mudança de paradigma, pois introduzimos o conceito de que a Agência é parceira, e não apenas financiadora [dos projetos].”

Na prática, a AEB passou a assumir um controle mais técnico das missões, convidando especialistas para a avaliação das iniciativas coordenadas pela AEB com caráter mais educacional e de formação de recursos humanos, como as missões de pequenos satélites da modalidade cubesat. Dentre os convidados, professores da Universidade La Sapienza, de Roma, e Jordi Puig-Suari, da Universidade Politécnica da Califórnia, apontado como um dos maiores especialistas do mundo em cubesats.

Os professores convidados avaliaram os projetos nacionais do tipo tendo, ao final, apresentado um relatório com sugestões para aprimoramentos. Um caso citado por Gurgel foi o da missão ITASAT, do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), considerada extremamente complexa para os meios até então disponíveis para o ITA – embora muito diferentes em termos de massa, do ponto de vista de sistemas o ITASAT em si não é muito diferente da Plataforma Multimissão (PMM). desenvolvida pela indústria e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Após os apontamentos, houve uma reunião entre a AEB e o ITA para a reorganização da missão, definindose uma maior destinação de recursos financeiros e orçamentários. O cubesat está pronto desde meados de 2016, aguardando o seu lançamento, que deve acontecer no início de 2017, a bordo de um foguete Falcon 9, lançado nos Estados Unidos.

Como parte de seu maior envolvimento com os projetos universitários, a AEB estabeleceu um centro de missão responsável por coordenar projetos de cubesats em praticamente todas as etapas, como definições de missão, custos de lançamento, importação e exportação, etc., que funciona como um facilitador do acompanhamento desses programas.

Esta ação mais sistemática da AEB passou a ser estruturada num programa específico, denominado Sistema Espacial para Realização de Pesquisas e Experimentos com Nanossatélites (SERPENS), promovendo o desenvolvimento de missões de cubesat, de baixo custo, junto às universidades, gerando capacitação de recursos humanos. A capacitação, aliás, não envolve apenas os alunos, mas também docentes e técnicos.

Segundo Gurgel, o SERPENS é direcionado principalmente às universidades que têm cursos de Engenharia Aeroespacial, tendo por foco o desenvolvimento da missão completa e não de sistemas isolados. As universidades praticam essencialmente engenharia de sistemas, com montagem, integração, testes, operação, em programas que tem duração em torno de 18 meses. Universidades e institutos como a UnB, ITA, Universidade Federal do ABC (UFABC), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), entre outras, tiveram ou têm projetos apoiados pela AEB. O SERPENS tem proporcionado a jovens estudantes um envolvimento completo em missões espaciais, estimulando a formação de recursos humanos altamente especializados. Alguns desses estudantes, tendo perfil de negócios, podem vir a empreender e abrir start-ups – de fato, algumas pequenas empresas espaciais já começam a surgir no Brasil. “A semente está plantada e é uma questão de tempo”, afirma Gurgel.

Ainda no âmbito educacional, Carlos Gurgel também destacou o projeto do Centro Vocacional Tecnológico Espacial (CVT Espacial), idealizado para “despertar o interesse da juventude pelas atividades espaciais”. A primeira unidade, situada em Natal (RN), já está praticamente finalizada, com sua inauguração prevista para o início de 2017. Fundamentalmente, o projeto prevê a oferta de infraestrutura e meios para o desenvolvimento de pequenas missões espaciais, como cansats (nanossatélites de dimensões similares a de uma lata de refrigerante) para estudantes dos ensinos fundamental e médio, contribuindo para a formação de recursos humanos.

Fonte: Tecnologia & Defesa n.º 147, dezembro de 2016.
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