.
O SGDC e os benefícios para a base tecnológica industrial
Eduardo Bonini
A construção do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações (SGDC) segue seu cronograma com a aprovação, no final do ano passado, do início da fabricação do satélite após a conclusão da Revisão Crítica do Projeto “Critical Design Review”, em inglês). Na medida em que ingressamos, agora, na segunda metade do projeto, é conveniente refletir sobre o que alcançamos e que desafios temos à frente. O impacto do uso de satélites na economia e na vida do nosso País é enorme, de forma que é relevante discutir qual modelo de indústria espacial queremos para o Brasil.
O SGDC promoverá uma pequena revolução nas telecomunicações, em particular nas regiões menos assistidas. A partir da sua ativação, o satélite proverá acesso à internet banda larga a todos os municípios brasileiros, mesmo os mais distantes. Tendo em vista a demanda reprimida existente e a necessidade de garantir a redundância do serviço nesses locais, logo será necessária uma avaliação sobre aumento da disponibilidade desse tipo de oferta.
As oportunidades, no entanto, vão muito além das telecomunicações. O Brasil poderia se beneficiar enormemente do uso da tecnologia espacial em uma série de setores chave como os da agricultura, proteção ambiental ou segurança, para citar apenas alguns. Arrisco mesmo a dizer que o Brasil é atualmente o país com maior carência em projetos espaciais no mundo. Notem que não estou me referindo a missões de cunho estritamente científico – também importantes numa visão de futuro – mas do estabelecimento de uma infraestrutura espacial operacional, com pronto retorno do investimento à sociedade.
Nossa indústria deverá ter papel primordial no estabelecimento dessa infraestrutura. A indústria espacial é pródiga no desenvolvimento de tecnologias de ponta, que depois serão aplicadas em outros setores da economia, os chamados transbordamentos tecnológicos. Empresas da base industrial espacial brasileira, hoje, aplicam tecnologias desenvolvidas em missões espaciais passadas em áreas tão díspares como óleo e gás, aeronáutica e biomédica. Mas o desenvolvimento de uma base industrial no setor do espaço requer, sobretudo, planejamento e continuidade de políticas e projetos.
A base tecnológica e industrial que temos hoje é fruto de décadas de investimento, é um ativo do nosso País. A incorporação de sistemas e componentes nacionais em projetos de grande porte requer investimento prévio e coordenado com pesquisa e desenvolvimento, qualificação de processos produtivos e missões espaciais para validação de tecnologias. Nossa base industrial precisa de encomendas recorrentes para manter as suas competências, de instrumentos financeiros de incentivo à inovação e à exportação e de missões experimentais para qualificar suas tecnologias e criar herança de voo. É a única maneira de se conseguir transformar esta base industrial em fornecedores de classe mundial.
Aqui está o grande desafio: conseguir manter uma base industrial sadia e operacional, através de programas espaciais que tragam retorno efetivo para o investimento realizado. Para que isso ocorra, esses projetos precisam ser executados com dinâmica industrial, superando requisitos de desempenho, atingindo prazos e custos previstos. O SGDC permitiu a criação de uma integradora de sistemas espaciais, lacuna por diversas vezes identificada, e trará novas tecnologias à nossa base industrial. É necessário manter as iniciativas e desenvolver oportunidades onde essas competências possam ser aplicadas.
Por fim, é imperativo que exista uma forte coordenação entre a indústria, institutos e universidades, com os setores chave do governo, demandantes e viabilizadores do Programa Espacial Brasileiro. Temos que buscar a racionalização do uso dos recursos, concentrando os investimentos em poucos projetos que tenham a capacidade de mobilizar o setor, que alinhem os esforços, e para os quais seja garantida a continuidade dos investimentos. Juntando forças seremos capazes de fazer mais e de atender à maioria das necessidades da Agência Espacial Brasileira e do Ministério da Defesa com um grau crescente de geração de tecnologia, conteúdo nacional e soberania.
N. da R.: Eduardo Bonini é presidente da Visiona Tecnologia Espacial S.A.
Artigo publicado na edição especial de Tecnologia & Defesa sobre atividades espaciais, em fevereiro de 2015.
.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário