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A saúde que vem do espaço
José Monserrat Filho *
É difícil justificar por que o Brasil, país continental e com tanto povo carente espalhado por seu imenso território (8,5 milhões de km²), ainda não tem um sistema de telessaúde e telemedicina por satélite. O uso do espaço em apoio aos serviços de saúde já é comum até em países menores que o nosso, como Alemanha (357 mil km²), Austrália (7.7 milhões de km²), Índia (3,3 milhões de km²), Nigéria (7.3 mil km²), Paquistão (796 mil km²) e outros. Pode ser uma rede de pequenos satélites.
Abordei essa questão nos quatro encontros conjuntos sobre o tema “A Telemedicina para a Universalização da Saúde”, realizados na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), de 28 a 30 de outubro, com ativa participação de renomados especialistas de vários países. Refiro-me aos 20º Congresso Internacional e 7º Brasileiro de Telemedicina e Telessaúde, ao 1º Simpósio Rio sobre Telessaúde e ao 4º Seminário do Programa Nacional de Telessaúde Brasil Redes.
A grande imprensa brasileira não cobriu nem noticiou o fato, mas nem por isso ele deixou de ser extremamente relevante, tanto pelos temas debatidos, experiências e avanços revelados, como pelo alto nível nacional e internacional dos participantes. Muitos dos melhores especialistas do mundo no assunto discutiram sobre como agir mais depressa, com mais urgência, cobrindo enormes distâncias, para salvar mais vidas, prevenir e enfrentar surtos, epidemias, pandemias e endemias, e assegurar uma vida mais saudável para milhões de seres humanos.
Lá estavam o Presidente e o Diretor Executivo da International Society for Telemedicine & eHealth – ISfTeH (Sociedade Internacional de Telemedicina e eSaúde), respectivamente Drs. Andy Fischer (Canadá) e S. Yunkap Kwankam (Camarões); os Drs. Marcial Garcia Rojo (Espanha), Presidente da Associação Ibero-Americana de Telessaúde e Telemedicina; Yulun Wang, Presidente da Associação Americana de Telemedicina; Pedro Lara de Arruda, do Centro de Política Internacional para o Crescimento Inclusivo, do Escritório de Política de Desenvolvimento das Nações Unidas; Maurice Mars, da Universidade Kwazulu Natal, África do Sul; K. Ganapathy, da Rede Apollo de Telemedicina, Índia; Murrugara Velarde, da Associação Peruana de Telemedicina; Antonio Marttos, da Universidade de Miami, EUA, e do Comitê Olímpico Internacional/Rio; Andre Petitet, da França; Olajide Joseph Adebola, Presidente da Sociedade de Telemedicina e Telessaúde da Nigéria; Ayotunde Joseph Ade-agbo Owosho, também da Nigéria; Daniel Opoku, de Gana; Betina Bruun, da Dinamarca; Gabriel Catan, de Israel; Luis Velez Lapão, de Portugal; Katelin Gresty e Marie-Pierre Ggnon, do Canadá; Pirkko Kouri, da Universidade da Savonia, Finlândia; Claudia Bartz, Conselho Internacional de Enfermagem, EUA, e Titilayo Doroty Odetola, EUA; Anna F. Schmaus-Klughammer e Patrick L. Scheid, da Alemanha;Timo Frett e Markus Lindlar, da Agência Espacial Alemã; Meena Rafiq, do Reino Unido; Ronald Buyl, da Bélgica; Alan Taylor, da Austrália; Ron Emerson, Diretor Global da Healthcare Polycom; além de outros experts.
O Dr. Mikhail Naenzon, da Agência Nacional de Telemedicina da Rússia, apareceu na tela do auditório, falando direto de Moscou sobre as atividades de sua instituição, e o Dr. Rifat Latifi, da Universidade do Arizona (Tucson), EUA, e da Fundação Virtual Internacional e-Hospital, não podendo vir, enviou um vídeo muito informativo, mostrando as realizações em saúde de dois dos países mais pobres da Europa, Albânia e Kosovo – esse após a guerra de 1998-99, que o dizimou.
O Conselho Brasileiro de Telemedicina e Telessaúde promoveu o Congresso Brasileiro, sob a Presidência do Dr. Cláudio Souza e a Vice-Presidência da Dra. Ana Estela Haddad, tendo como Diretor Científico o Prof. Luis Ary Messina, Coordenador Nacional da Rede Universitária de Telemedicina (RUTE). A RUTE tem 118 núcleos em operação no país e terá 120 até o fim do ano.
Índia e Maranhão foram eleitos para sediar, respectivamente, o 21º Congresso Internacional, e o 8º Congresso Brasileiro de Telemedicina e Telessaúde.
Universidades e entidades públicas e privadas de 16 estados tiveram destacada atuação: Alagoas, Amazonas, Ceará, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Pernambuco, RJ, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe.
Importantes instituições brasileiras participaram dos Congressos: Agência Espacial Brasileira (AEB), Capes, Centro Integrado de Estudos e Programas de Desenvolvimento Sustentável (CIEDS), Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic), CNPq, Comitê Rio 450 Anos, Finep, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Medicina Assistida por Computação Científica (INCT-MACC), Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC/MCTI), Ordem dos Advogados do Brasil/RJ e SP; Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS); e Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP).
“A Telessaúde no Brasil e a Inovação Tecnológica na Atenção Primária”, livro de 450 páginas, lançado na ocasião, foi organizado por Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim, Bruno Gomes de Araújo, Tâmara Albuquerque Leite Guedes e Alexandre Medeiros de Figueiredo, com a participação de 54 autores de todo o país, e publicado pela Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Edufrn).
O Brasil sediou esse grande encontro de telessaúde e telemedicina porque já alcançou grandes progressos nesta área. Temos o Programa Nacional TELESSAÚDE BRASIL REDES NA ATENÇÃO BÁSICA, que compõe o Programa de Requalificação das Unidades Básicas de Saúde (UBS), criada em 2011. O TELESSAÚDE BRASIL nasceu em 2007 com o Projeto Piloto em apoio à Atenção Básica, envolvendo nove núcleos localizados em universidades do país. Em 2011, expandiu o financiamento para núcleos intermunicipais e estaduais. Hoje, funciona em todos os estados. E tem cerca de 6 mil pontos de Telessaúde, instalados em Unidades Básicas de Saúde (UBS) de 2.600 municípios, e 50 mil profissionais de equipes de atenção básica/saúde da família que podem acessar os serviços de Telessaúde. O Manual Instrutivo do Programa, publicado pelo Ministério da Saúde, neste ano, explica que o TELESSAÚDE BRASIL visa “potencializar a qualificação da Atenção Básica/Estratégia de Saúde da Família, ao estimular o uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) para atividades à distância relacionadas à saúde”. Diz mais: “O TELESSAÚDE pode possibilitar a interação entre profissionais de saúde, bem como o acesso remoto a recursos de apoio educacional, clínico e diagnóstico.”
O TELESSAÚDE passou, em 2012, a disponibilizar teleconsultorias por telefone em apoio aos médicos da Atenção Básica participantes dos Programas: Mais Médicos para o Brasil, Valorização da Atenção Básica (PROVAB) e Melhoria do Acesso e da Qualidade (PMAQ), e às equipes do Programa Melhor em Casa. Isso facilita o acesso à informação e agiliza a tomada de decisões para resolver questões de saúde e dúvidas clínicas, dispensando o agendamento prévio.
O uso dos serviços de teleducação e telediagnóstico cresceu muito nos últimos quatro anos. O mesmo precisa acontecer com a teleconsultoria, pois ela pode ampliar a capacidade de resolver os problemas por parte do solicitante necessitado.
O TELESSAÚDE BRASIL terá chance de crescer ainda mais e com eficiência ainda maior se contar com um sistema espacial de apoio. Por que não criar uma rede de satélites dedicados ao Programa Telessaúde e Telemedicina? Daí a minha proposta de se constituir um grupo de trabalho (GT) para estudar a possibilidade e a viabilidade de elaborar o projeto de uma rede de satélites para prestar serviços de telemedicina, reunindo especialistas do governo, da academia e da indústria. Quem se habilita a liderar esse processo?
Vale também sugerir que o BRICS crie um projeto de telemedicina por satélite. O BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) já pôs em sua agenda a ideia de promover a cooperação espacial. Por que não começar essa colaboração com um serviço de primeiríssima necessidade não só para seus cinco países-membros, mas também para dezenas e dezenas de outros países em desenvolvimento? Foi o que propus no painel “A telessaúde e os BRICS”.
A telemedicina por satélite pode tanto gerar considerável poupança para os contribuintes dos serviços de saúde, como melhorar mais rapidamente a saúde dos pacientes.
* Vice-Presidente da Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA), Diretor Honorário do Instituto Internacional de Direito Espacial, Membro Pleno da Academia Internacional de Astronáutica (IAA) e Chefe da Assessoria de Cooperação Internacional da Agência Espacial Brasileira (AEB). Este artigo expressa tão somente a opinião do autor.
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