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quarta-feira, 22 de abril de 2015

LAAD 2015: ACS, Programa Espacial, EUA

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A edição desta semana da publicação especializada Space News traz duas interessantes reportagens sobre o Programa Espacial Brasileiro. De autoria do experiente Peter Selding, os textos foram preparados com base em entrevistas e informações coletadas durante a LAAD Defence & Security, feira realizada no Rio de Janeiro (RJ) durante a semana passada.

Um dos textos (“Brazil Pulling Out of Ukrainian Launcher Project”) trata da atual situação da binacional Alcântara Cyclone Space (ACS), aproveitando-se de informações que já haviam sido divulgadas em reportagens da imprensa brasileira nas últimas semanas. A novidade foi a citação de declarações dadas por Petrônio Noronha de Souza, diretor da Agência Espacial Brasileira (AEB) - a primeira vez que uma autoridade se pronuncia oficialmente a respeito (curiosamente, para um veículo estrangeiro e não brasileiro, apesar de diversas tentativas por parte da imprensa brasileira). “É um acúmulo de coisas” (uma tradução rápida de “It is an accumulation of issues”), afirmou Noronha, destacando problemas com orçamento, aspectos tecnológicos, relacionamento entre o Brasil e a Ucrânia e o mercado disponível para exportação.

Nos bastidores, comenta-se sobre a disposição do lado ucraniano em pleitear uma indenização em razão do cancelamento do projeto nacional; a cifra ouvida pelo blog gira em torno de R$800 milhões.

A outra reportagem, intitulada “Brazil Bypassing the U.S. as It Builds out a Space Sector”, aborda o suposto direcionamento dado pelo governo brasileiro a parcerias com determinados países, como China (CBERS), Alemanha (VSB-30, VLM), Argentina (SABIA-MAR) e Franca (SGDC), ignorando os EUA. Apesar de interessante, a análise do autor é um pouco superficial, ignorando alguns itens importantes.

Muito embora não haja um grande projeto espacial conjunto entre o Brasil e os EUA, não se pode ignorar a dependência brasileira de meios norte-americanos para atividades críticas, como o monitoramento do desmatamento da Amazônia (Landsat) e previsões meteorológicas (satélites GOES). Os EUA ainda exercem papel importante na formação de recursos humanos para o Programa Espacial Brasileiro, e em pesquisas envolvendo aplicações de dados espaciais. Ainda, cite-se o fato de que o SGDC não e um satélite ITAR-free (isto é, contém componentes, inclusive críticos, de origem norte-americana), tanto no segmento espacial como terrestre, e algumas iniciativas de menor porte - mas com importante significado, no campo de cubesats (inclusive envolvendo as forças armadas).

O último parágrafo da reportagem tem uma citação interessante e parcialmente verdadeira, creditada a um executivo (não identificado) de uma companhia europeia fabricante de satélites. “O modelo para o espaço [buscado pelo Brasil] é o modelo da Embraer”. Disto deveria surgir o seguinte questionamento: a Embraer chegou ao que é hoje “ignorando” os Estados Unidos?
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quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Cooperação Brasil - China: lançadores (!?)

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Ministro Campolina assina acordo de colaboração espacial com a China  

Brasília, 10 de dezembro de 2014 – O ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Clelio Campolina Diniz, assinou carta de intenções com a Administração Espacial Nacional da China (CNSA, na sigla em inglês) ontem (9), antes de embarcar de volta ao Brasil.

“Assinamos um acordo de colaboração para os próximos dez anos”, disse o ministro. “A partir dele, vamos discutir as etapas técnicas e os cronogramas das futuras atividades. Há um desejo mútuo de continuar trabalhando junto”.

Segundo ele, a carta de intenções abre possibilidade de desenvolver um programa conjunto de foguetes lançadores – atividade dominada pela Corporação Chinesa de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (Casc, na sigla em inglês), cuja sede o ministro conheceu na segunda-feira (8). “Na cooperação atual, o Brasil trabalha mais com o satélite, enquanto a Casc se encarrega, na China, de toda a preparação do veículo lançador”, explicou Campolina.

Na sede da CNSA, em Pequim, o ministro viu imagens do satélite Cbers-4, lançado domingo (7), da base de Taiyuan, de onde o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) já realiza testes de câmeras.

Encontro - No país asiático desde quinta-feira (4), Campolina também se encontrou com o ministro chinês da Ciência e Tecnologia, Wan Gang, na segunda-feira (8), quando os gestores discutiram pautas comuns. Gang esteve no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) em agosto de 2012.

“Tivemos uma longa conversa sobre nossas agendas comum. Estamos programando o 2º Diálogo de Alto Nível Brasil–China em Ciência, Tecnologia e Inovação, a ser realizado em Brasília, no primeiro semestre de 2015″, informou Campolina.

Ocorrida em 2011, em Pequim, a primeira edição do Diálogo de Alto Nível abordou parcerias em agricultura, energias renováveis, nanotecnologia, segurança alimentar e tecnologias da informação.

“Agora, estamos discutindo os temas mais relevantes da cooperação, como a área espacial, a presença de empresas chinesas no Brasil, a exemplo da Baidu e da Huawei; os convênios entre universidades dos dois países e o programa Ciência sem Fronteiras”, disse.

Campolina recordou o entendimento firmado entre a presidenta Dilma Rousseff e o presidente chinês, Xi Jinping, em visita oficial ao Brasil, em julho último, para ampliar a participação do país asiático no programa de mobilidade acadêmica. “Neste momento, temos 253 alunos aqui, com intenção de aumentar o número. As universidades chinesas estão muito bem preparadas. Encontramos pessoas falando e dando curso em inglês. Então, não há dificuldade de inserção dos estudantes. E eles têm muita fronteira de pesquisa”, observou o ministro.

Diálogo - Ontem (9), Campolina também participou de reunião na Academia Chinesa de Ciências (CAS, na sigla em inglês). “Fizemos uma longa discussão dos interesses comuns. Eles nos apresentaram suas atividades e abordamos iniciativas brasileiras, como o Programa Nacional de Plataformas do Conhecimento”, disse. “Convidamos a entidade para o Diálogo de Alto Nível no Brasil e planejamos, inclusive, discutir a colaboração Sul-Sul”, informou. “Ou seja, além da parceria bilateral, estamos querendo estender algum tipo de serviço para a América Latina e a África, como imagens de satélite”.

Também onte, Campolina conheceu o centro de demonstração de soluções da Huawei em Pequim. O ministro lembrou que a companhia doou parte dos equipamentos dos Centros de Dados Compartilhados (CDCs) de Manaus e Recife, em parceria dos ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e da Educação (MEC), por meio da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP). “A empresa ainda tem um centro em Sorocaba (SP), para o qual avisaram que devem aumentar os investimentos em pesquisa”, informou.

A missão brasileira à China começou na sexta-feira (5), em Xinhui, quando Campolina visitou o estaleiro que desenvolve o navio hidroceanográfico Vital de Oliveira, que integra o projeto do Instituto Nacional de Pesquisas Oceanográficas e Hidroviárias (Inpoh). De lá, a delegação seguiu para Taiyuan, onde acompanhou o lançamento do Cbers-4 e se deslocou para Pequim, onde cumpriu agenda nos dois últimos dias.

Acompanharam o ministro o presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), José Raimundo Braga Coelho, o diretor geral do Inpe, Leonel Perondi, o ex-ministro de C&T, Marco Antonio Raupp, e o diretor de Planejamento, Orçamento e Administração da AEB, José Iram Mota Barbosa.

Fonte: MCTI

Comentário do blog: interessante (e curiosa) as discussões (imagina-se, bem preliminares) sobre a possibilidade de cooperação em veículos lançadores com a China, por seus reflexos internacionais (leia-se, ITAR, legislação americana que restringe exportações de tecnologias sensíveis). Ressalte-se, aliás, que desde o seu início o programa CBERS jamais envolveu transferência tecnológica, o que não impediu, porém, que indústrias e instituições brasileiras envolvidas na missão sofressem restrições decorrentes da legislação americana.
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quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Orbital Engenharia se associa a chineses

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Empresa brasileira firma acordo com chineses no setor aeroespacial

Brasília, 20 de agosto de 2014 – A empresa Orbital Engenharia Ltda, de São José dos Campos (SP), firmou Acordo de Cooperação no setor aeroespacial com a China Great Wall Industry Corporation (CGWIC) e com o Shanghai Institute of Space Power Sources (Sisp).

A empresa nacional é a primeira do país a assinar parceria com instituições chinesas. O acordo é fruto da rodada de negociações realizada na China entre empresas brasileiras e do país promovida com o apoio da Agência Espacial Brasileira (AEB), em dezembro de 2013, quando do lançamento do quarto satélite do programa Satélite Sino-Brasileiro de Sensoriamento Remoto (Cbers, na sigla em inglês), em Taiyuan.

Segundo Célio Costa Vaz, diretor da Orbital, a empresa representará comercialmente as duas instituições chinesas no Brasil, mas o acordo prevê também o desenvolvimento de projetos e produtos. “Inicialmente, vamos atuar no país, mas, futuramente, pretendemos prospectar o mercado latino-americano”, destaca Vaz.

Para o empresário, o acordo é uma demonstração de que a indústria aeroespacial do país goza de prestígio e é avaliada com respeito e seriedade pelos chineses. Em sua opinião, a parceria também contribui para uma aproximação mais estreita entre empresas do setor dos dois países.

De acordo com o presidente da AEB, José Raimundo Braga Coelho, esse acordo mostra o bom potencial de negociações que podem ser firmadas entre entidades dos dois países. Para ele, a parceria também deve contribuir para que outras empresas do setor busquem ampliar negociações no exterior.

Fonte: AEB

Comentários do blog: a (arrojada, para muitos) estratégia da Orbital Engenharia de se associar aos chineses pode ser analisada por diferentes óticas. Embora represente uma boa oportunidade em razão dos laços já criados pela China em projetos no Brasil (CBERS) e outros países sul-americanos (Venezuela, Bolívia), oferece também certo riscos. Há o risco de conflito entre as atividades industriais propriamente ditas (o expertise da Orbital reside, principalmente, em painéis solares e propulsão) e aquela de representação comercial. Vale citar que a empresa é uma das potenciais beneficiárias dos offsets relacionados ao Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), em construção pela Thales Alenia Space, caso estes vinguem. Tem também envolvimento e interesse no SCD-Hidro. Ainda, não podem ser ignorados eventuais efeitos adversos decorrentes do International Traffic in Arms Regulations (ITAR), dos EUA.

A CGWIC é o principal conglomerado espacial da China. Na América do Sul, além do envolvimento com o programa CBERS, a CGWIC tem tido significativo sucesso na venda de soluções turn-key em satélites de comunicações e sensoriamento remoto para a Venezuela e Bolívia. No Brasil, com base em tratativas bilaterais, o conglomerado tem também grande interesse na futura missão meteorológica geoestacionária nacional (veja o artigo "Satélite meteorológico: um próximo passo").
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quarta-feira, 16 de outubro de 2013

AEB: oportunidades comerciais na China

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Indústria aeroespacial analisa oportunidades no mercado externo

Brasília 15 de Outubro de 2013 - O Brasil recebe um tratamento especial da China no que tange à cooperação na área espacial, segundo afirmação do governo daquele país. Como os chineses veem expandindo seus negócios no setor com diversas nações essa também é uma oportunidade para as indústrias aeroespaciais brasileiras ampliarem seus negócios e ofertas de serviços.

Esse foi um dos tópicos da pauta do encontro entre diretores da Agência Espacial Brasileira (AEB) e representantes de 14 empresas do segmento aeroespacial nesta segunda-feira (14), em Brasília (DF). Os empresários, ligados a Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (AIAB), foram incentivados a usufruírem mais do programa Ciência sem Fronteiras Espacial e também aproveitarem o conhecimento qualificado que o mercado passa a receber com o retorno ao país de pessoas que se qualificaram no exterior.

O presidente da AEB, José Raimundo Braga Coelho, falou sobre as negociações entre Brasil e China envolvendo a cooperação espacial nos próximos dez anos. “Essa ampliação de atividades com os chineses também é uma janela de oportunidades que a indústria nacional não pode desprezar”, alertou. Em sua opinião, as empresas brasileiras devem buscar conhecer a atual diversificação de produtos e serviços promovida por diversas empresas chinesas do segmento aeroespacial.

Nesse sentido o presidente convidou os empresários a se integrarem à comitiva da AEB, que acompanhará o lançamento do satélite sino-brasileiro de sensoriamento remoto (Cbers-3), em dezembro próximo, na China. Na oportunidade, eles poderão visitar empresas em Shangai, conhecer seus processos de modernização e estabelecer contatos para futuras plataformas de negócios.

Os representantes das empresas ainda foram informados sobre outra modalidade de bolsa que o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) lança no início de 2014. Trata-se da bolsa de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação, que visa a aprimorar em estágios no exterior profissionais que já tenham qualificação considerada avançada. O diretor de Satélites, Aplicações e Desenvolvimento, Carlos Alberto Gurgel, disse que há uma cota dessas bolsas reservadas para a AEB, “portanto os empresários não devem perder esse benefício”.

Fonte: AEB

Comentário do blog: apesar da janela de oportunidades de negócios com a China não poder ser "desprezada", segundo disse o presidente da AEB, um aspecto que deve ser cautelosamente analisado por qualquer indústria espacial que busque negócios na China é o risco de se bloquear outros mercados por conta da regulação ITAR (International Traffic in Arms Regulations), dos EUA. Ainda que a ITAR tenha sido recentemente flexibilizada, ainda há grandes restrições em relação a exportação de tecnologias para a China ou países que tenham negócios com os chineses. Diversas indústrias nacionais participantes do programa CBERS enfrentaram problemas com a importação de tecnologia, equipamentos ou componentes de origem norte-americana, ainda que não destinados ao programa do satélite sino-brasileiro.
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terça-feira, 4 de dezembro de 2012

"O que podemos aprender com as falhas de componentes do CBERS-3?"


Reproduzimos abaixo os comentários feitos por Gilberto Câmara, ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), referentes a uma reportagem publicada no "Jornal SindCT" no último mês de novembro (para ler a reportagem, acesse a postagem "Os problemas do CBERS 3"). Tais comentários foram enviados por Câmara ao blog Panorama Espacial e também circulados hoje na comunidade espacial.

"O que podemos aprender com as falhas de componentes do CBERS-3?"

Gilberto Câmara (pesquisador do INPE, diretor do INPE de 2005 a 2012)

Na semana passada, o jornal do SindCT (Sindicato dos Servidores Públicos Federais em Ciência e Tecnologia) publicou o artigo "Falha em componente atrasa lançamento do CBERS-3".

A matéria faz um apanhado dos problemas enfrentados com os conversores DC/DC do CBERS-3. Em sua primeira parte, apresenta o problema de forma equilibrada. Infelizmente, a segunda parte da artigo cai na armadilha usual de "buscar culpados". Faz questionamentos genéricos, buscando inclusive identificar "quem deverá arcar com os gastos financeiros extras?".

Não se pode negar que se trata de um problema delicado. As decisões que a equipe do INPE está a tomar para resolver o problema não são fáceis. Mas é importante que a comunidade inpeana e os interessados pelo programa espacial evitem julgamentos precipitados. A lógica de "buscar culpados" é enganosa e injusta.

A equipe do INPE tem todas as condições e conhecimento para investigar o defeito nos conversores DC/DC, determinar qual foi a origem da falha e tomar a melhor decisão possível dentro das circunstâncias. Antes de ter opiniões apressadas, é preciso saber que os componentes com qualificação espacial usados no CBERS são tecnologia de duplo uso e estão sujeitos a controles de exportação. É também importante entender a cadeia de eventos que levou o INPE a comprar os conversores DC/DC da empresa MDI.

O projeto CBERS tem, até agora, duas grandes fases: o projeto e construção do CBERS-1,2 e 2B (1990-2003) e o do CBERS 3 e 4 (2000-2015). Na primeira fase, a responsabilidade brasileira era de 30% do satélite e a indústria espacial chinesa ainda estava se desenvolvendo. Na segunda fase, nosso compromisso é de construir 50% do satélite, inclusive com metade da carga útil. A indústria espacial chinesa está madura e lança mais de 20 satélites por ano.

Outra grande diferença entre a primeira e a segunda fase do programa CBERS foi o grande aumento do controle de exportação de produtos sensíveis pelo governo americano. O projeto das partes brasileiras do CBERS-1,2, e 2B foi feito nos anos 90, quando as restrições de exportação de componentes dos EUA eram menores que hoje. Nos satélites CBERS-1,2, e 2B, a participação brasileira incluía o fornecimento de subsistemas que tinham componentes de fabricação americana, que foram comprados de empresas dos EUA sem maiores problemas durante a década de 90.

A estratégia adotada no programa CBERS desde o início dos anos 2000 e seguida até hoje é: (a) o INPE contrata os subsistemas à industria brasileira; (b) compra no mercado internacional os componentes eletrônicos não produzidos no Brasil; (c) fornece os componentes às empresas para que os integrem nos equipamentos que contratamos; (d) testa e qualifica esses subsistemas no LIT. As empresas assim atuam como extensões do INPE, que é o "mestre de obras" dos satélites.

Esta lógica de compra de componentes pelo INPE foi adotada pelo instituto devido a dois fatores importantes: controle de qualidade e redução de custos. Ao comprar os componentes, o INPE faz a inspeção e o controle de qualidade antes de entregá-los à industria. De forma geral, isto aumenta a confiabilidade dos equipamentos. Outro aspecto é a redução de custos. A  lei brasileira prejudica o desenvolvimento tecnológico nacional. Há um imposto de importação muito alto sobre componentes eletrônicos, que teria de ser pago pela indústria caso os importasse diretamente. O INPE é dispensado de pagar este imposto. Como o cliente final é o INPE, o instituto considera que fica caro financiar o Tesouro Nacional com dinheiro público. Assim assumimos a responsabilidade pela importação.

O INPE se preparou para usar no CBERS-3/4 a mesma lógica que havia funcionado no CBERS-1/2/2B: comprar componentes de boa qualidade e repassá-los à indústria. Só que as regras americanas de exportação haviam mudado.

Nos EUA, aconteceram eventos no final dos anos 90 que mudaram fundamentalmente a política americana de controle de armas. A divisão entre conservadores e democratas, que hoje está mais forte que nunca hoje, aprofundou-se nos anos do governo de Bill Clinton (1993-2002). O escandalo Monica Lewinsky enfraqueceu a popularidade de Clinton. Em 1996, os republicanos assumiram o controle da Câmara dos Deputados, e chegaram a votar o impeachment de Clinton em 1998 (ele foi absolvido pelo Senado). Antes como agora, os republicanos construíram sua imagem publica na defesa do isolacionismo americano e no medo do inimigo externo (antes, a URSS e hoje a China).

No anos 90, houve um escândalo envolvendo as empresas Loral e Hugues. Elas foram acusadas pelo governo americano de fornecer informações secretas à China que teriam permitido aos chineses melhorar a qualidade e a precisão de seus satélites e misseis. A alegação dizia que a Loral e a Hugues teriam interesse em vender satélites para a China e de lançar seus satélites para clientes não americanos com foguetes chineses, mais baratos e mais confiáveis. Ao mesmo tempo, um segundo escândalo aconteceu na área nuclear. O FBI e a CIA informaram ao Governo dos EUA que teria havido um roubo de projetos de armas nucleares americanas pela China. Bombas nucleares denotadas em explosões subterrâneas pela China teriam o mesmo perfil sismico que dispositivos dos EUA.

Os dois escândalos (nuclear e espacial) levaram a Câmara dos Deputados (de maioria republicana) a criar o equivalente de uma CPI ("Select Committee") sobre "US National Security and Military/Commercial Concerns with China". Isto no auge do escandalo Lewinsky e do impeachment de Clinton. O relatorio (disponível na internet) concluiu: "China has stolen or otherwise illegally obtained U.S. missile and space technology that improves China's military and intelligence capabilities."

Neste clima de caça às bruxas chinesas, o Congresso americano aprovou em 1999 o “Strom Thurmond National Defense Authorization Act For Fiscal Year 1999", onde decretou que “all satellites and related items that are on the Commerce Control List of dual use items in the Export Administration Regulations (...) shall be transferred to the United States Munitions List and controlled under section 38 of the Arms Export Control Act". Em outras palavras, a partir de 1999 todos os itens relacionados com tecnologia de satélites foram reclassificados de “tecnologia de uso dual” para “armas de guerra” e sujeitos diretamente ao controle do exportações americano. O ato tem provisões adicionais específicas para a China, e estabelece que fica proibida qualquer exportação para a China de itens na lista de munições.

Esta mudança substancial da legislação americana não foi acompanhada de perto nem pelo INPE, nem pela AEB, nem pelo Itamaraty, nem pela indústria. Como resultado, no início dos anos 2000, quando o INPE fez o projeto dos equipamentos a ser usados nos satélites CBERS-3 e 4, usou a mesma lógica dos satélites anteriores. Os projetos foram feitos no período de 2000 a 2005 e as licitações para escolha das empresas brasileiras fornecedoras de subsistemas foram feitas de 2004 a 2006. A partir de 2007, o INPE começou a comprar os componentes eletrônicos necessários para a construção dos subsistemas do CBERS para os projetos já contratados de 2004 a 2006. E aí enfrentamos as barreiras de exportação.

Tivemos problemas em muitos componentes. Em meados de 2006, o INPE tentou comprar um transistor de potência ("field effect transistor") para ser usado no transmissor de dados das câmaras de imageamento do CBERS-3 e 4. O equipamento é fabricado por uma subsidiária americana da Fujitsu, que se negou a fornecê-lo. Como o INPE já havia comprado o mesmo componente antes de 2000 para uso nos CBERS 1, 2 e 2B, ficamos surpresos com as novas restrições.

No inicio de 2007, eu (então diretor do INPE) e Miguel Henze (na época Diretor de Satélites e Aplicações da AEB) fomos a Washington para uma reunião com a Sra. Ann Ganzer, diretora do Defense Trade Controls Policy, Bureau of Political Military Affairs do Departamento de Estado, e portanto responsável pela aplicação das regras de controle de exportação de componentes sensíveis.

Explicamos à Sra. Ganzer que o CBERS era um satélite exclusivamente civil, e que os subsistemas brasileiros eram enviados à China como "caixas-pretas" e o projeto desses subsistemas não era compartilhado com os chineses. Também manifestamos nossa surpresa com a mudança das regras de controle de exportação. Após ouvir a nossas explicações sobre o programa CBERS, a Sra. Ganzer apresentou em detalhe a política dos EUA em vigor desde 1999, descrita acima. Ela nos disse que, a partir de 1999, o CBERS é considerado um programa associado à China e satélites CBERS estão sujeitos ao embargo previsto na lei americana.

Assim sendo, foi apenas em 2007 que o Governo brasileiro (através do INPE e da AEB) tomou conhecimento das novas regras de controle de exportação. Naquele momento, as licitações dos subsistemas do CBERS já estavam fechadas e as empresas contratadas já estavam projetando os equipamentos.

Para complicar ainda mais a vida do INPE, a lei americana não é clara. A lista de componentes controlados não é disponível publicamente de forma detalhada. A orientação do Departamento de Estado é que as empresas interessadas em vender componentes façam um pedido de licença de exportação, que é analisado caso a caso. Assim sendo, não é possível estabelecer um limite claro sobre o que é possível comprar dos EUA e o que será vetado.

O INPE adotou então a seguinte postura:

(a) Solicitar as empresas americanas potencialmente fornecedoras que fizessem pedidos de licença de exportação. Caso uma empresa inicialmente contactada não quisesse fazer este pedido, buscava-se outro fornecedor com capacidade equivalente.

(b) Quando não havia fornecedor americano, buscava-se um fornecedor europeu com componentes equivalentes não sujeito ao controle de exportação dos EUA.

(c) Quando não havia fornecedores americanos com licença de exportação nem europeus com componentes equivalentes, o INPE refez o projeto do subsistema para usar componentes que pudessem ser importados.

No caso do transmissor de dados de banda X, não houve fornecedores americanos que tivessem licenças de exportação nem europeus com equivalência. Foi preciso refazer o projeto, com aumento de custos e atraso de prazo.

No caso dos conversores DC/DC, o fornecedor originalmente desejado pelo INPE não se interessou em fornecê-los. O INPE comprou então os componentes da empresa MDI. Esta empresa tem reputação no mercado e já forneceu componentes para diversos programas, como KOMPSAT (satélite coreano) e SAC-D (satélite argentino). Os componentes da MDI foram inspecionados pelo LIT e fornecidos às empresas. O INPE agiu neste caso com o mesmo procedimento adotado com os demais componentes.

Os conversores DC/DC foram apenas alguns dentre milhares de componentes adquiridos pelo INPE. Todos adquiridos por processos semelhantes, atendendo a parâmetros ditados em normas internacionais. Os equipamentos que usavam os conversores DC/DC foram testados e qualificados pelo LIT, que adota procedimentos de qualidade de padrão mundial. Todos os testes e verificações padrões foram feitos. O problema com os conversores só foi verificado na China, nos procedimentos finais que antecedem ao lançamento.

Os subsistemas brasileiros do satélite CBERS-3 tem milhares de componentes, alguns fornecidos por empresas americanas, outros pela Europa e até pela China. O INPE adotou com a empresa MDI o mesmo procedimento que temos com todos os fornecedores. Todas as empresas contratadas tem experiencia no mercado e são fornecedoras de outros programas espaciais. As decisões de projeto foram tomadas em boa fé, a partir da técnica disponível, da maturidade das equipes, e das circunstâncias. A indisponibilidade ampla de componentes, e a consequente escolha da MDI, foram circunstâncias com as quais as equipes tiveram que lidar.

Além das dificuldades de comprar produtos de qualificação espacial no Exterior, a equipe do INPE teve de enfrentar ainda a total incompreensão da burocracia estatal, especialmente dos advogados da CJU/AGU-SJC. Entre muitos exemplos de desconexão com o interesse público, a AGU questionou, por exemplo, a substituição de componentes por seus equivalentes. Recusou-se a entender como funcionam os controles de exportação de tecnologia de uso dual. Chegou a acusar o INPE de ser uma "casa da Mãe Joana" por ter de substituir componentes embargados por outros equivalentes não sujeitos a embargos americanos.

Verifica-se assim que há uma longa cadeia de eventos desde o inicio do projeto do CBERS-3 até a falha dos conversores DC/DC ocorrida há poucos meses. Deve-se resistir ao máximo à tentação de construir "teorias da conspiração". Num projeto de alta complexidade numa área de tecnologia dual, é impossível atribuir uma falha a um único responsável. De quem é a culpa? Da everestiana burocracia brasileira? Da empresa MDI? Do INPE? Da AEB? De Monica Lewinsky? Ou do Strom Thurmond, o senador racista da Carolina do Sul que teve uma filha mulata com uma empregada negra?

O único fato inegável é que só erra quem faz. E na área espacial, é preciso fazer muitas vezes para poder acertar. O programa espacial chines é um bom exemplo. Apesar do grande número de satélites lançados, o tempo de vida médio de um satélite chines ainda é muito inferior os dos equivalentes americanos. Uma das razões é a menor qualidade dos componentes eletrônicos usados nos satélites da China. Nem por isso, os chineses desanimam. Pelo contrário, buscam entender as razoes das falhas e tentam de novo.

Se em lugar de ter recursos humanos e materiais para lançar um satélite a cada quatro anos, o Brasil lançasse quatro satélites por ano, problemas como os conversores DC/DC já teriam sido identificados e corrigidos. Ao receber recursos reduzidos, coloca-se a reputação do INPE em jogo de forma perigosa. Enquanto o programa espacial brasileiro não tiver uma dimensão industrial significativa, problemas como o conversor DC/DC continuarão a aparecer, sempre com julgamentos negativos que não refletem a qualidade do time do INPE.

A atividade espacial é intrinsecamente de risco, que pode se manifestar das mais variadas formas - a falha de componentes e equipamentos é uma delas. É preciso conviver com eles e mitigá-los com medidas técnicas e programáticas. Tentar punir indivíduos ou organizações por conta de decisões técnicas coletivas não resolve o problema. Demonstra apenas ignorância sobre a realidade.

A equipe que trabalha no programa CBERS enfrenta dilemas quase intransponíveis. Além das dificuldades inerentes a um programa de satélites sofisticado, temos de vencer os embargos comerciais, as limitações de recursos e a total incompreensão de parte da burocracia estatal. Antes de acusar, é mais justo reconhecer o enorme esforço que nosso time está a fazer para que o projeto tenha sucesso.

Cordialmente
Gilberto

P.S. Para maiores informações, vejam os links

http://en.wikipedia.org/wiki/Cox_Report
http://en.wikipedia.org/wiki/Timeline_of_Cox_Report_controversy
http://www.house.gov/coxreport/
http://www.dod.mil/dodgc/olc/docs/1999NDAA.pdf
http://www.pmddtc.state.gov/official_itar_and_amendments.htm

P.S.2 Para quem quiser entender um pouco mais sobre a persistência chinesa, sugiro assistir a um docudrama sobre a vida de Qian Xuesen, pai do programa espacial chinês:

http://www.youtube.com/watch?v=WwlayRDU3Oo
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quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Os problemas do CBERS 3


Falhas em conversores do CBERS colocam MCTI e INPE em dilema

CBERS-3: Lançamento pode atrasar até dois anos 

Por Shirley Marciano

Durante testes finais realizados no Brasil e na China para lançamento do CBERS-3 foram constatados problemas em parte do sistema de energia do satélite, nos pequenos conversores DC/DC. Por este motivo, poderá haver atrasos significativos no cronograma de lançamento do satélite, inicialmente previsto para novembro de 2012.

Esses componentes foram comprados entre 2007 e 2008 da fabricante americana Modular Devices Incorporated – MDI para serem utilizados nos satélites CBERS 3 e 4. Curiosamente, esta empresa não teve que passar pelas restrições da International Traffic in Arms Regulations - ITAR, que é uma reguladora de venda de produtos classificados como críticos, e, de acordo com informações obtidas com pessoas envolvidas no processo de compra à época, este teria sido o fator determinante para a escolha desta empresa, já que havia muita dificuldade para se encontrar outros fornecedores que vendessem ao Brasil em razão dessas restrições.

Quando já estava tudo praticamente pronto para o lançamento, observou-se a falha de oito conversores DC/DC, dos 44 utilizados no CBERS-3. Ou seja, quase 20% dos conversores adquiridos para serem utilizados nos satélites simplesmente não funcionaram. Teoricamente seria uma simples questão de substituição; entretanto, a estatística mostrava que havia um risco alto de acontecer o mesmo com os demais componentes que ainda não haviam sido utilizados.

“Todos ficaram muito apreensivos com a gravidade da situação, pois embora existam componentes sobressalentes destes conversores no satélite para casos de falhas, a queima dessa quantidade de dispositivos era a constatação de que o problema poderia ocorrer novamente”, explica um especialista da área que não quis se identificar. Ele explica ainda que “componentes espaciais, durante os testes finais, devem ter sempre desempenho de altíssima confiabilidade, afinal, não é possível fazer a ‘manutenção’ do satélite uma vez que o mesmo esteja em órbita”. Assim, a lógica é simples: “estragou no espaço, perde-se todo o investimento, tempo e finalidade”, conclui.

Diante do problema, entre os dias 18 e 24 de agosto, cinco engenheiros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, incluindo o coordenador do Segmento Espacial do Programa CBERS, engenheiro Janio Kono, estiveram nos EUA para tentar identificar, junto à empresa fornecedora dos componentes, os motivos que levaram às falhas, conforme divulgado no Diário Oficial da União de 17 de agosto de 2012.

A empresa analisou os dispositivos que apresentaram falhas e emitiu um relatório técnico no dia 20 de outubro, no qual teria reconhecido que parte dos problemas surgidos pode ter sido causada por erros na fabricação dos componentes. Como todos os componentes adquiridos pelo INPE faziam parte de um mesmo lote, levantou-se a suspeita de que outros componentes que não apresentaram falhas durante os testes também pudessem vir a falhar.

O relatório aponta ainda outros motivos --estes de responsabilidade do INPE e da empresa Mectron, contratada para projetar e fabricar os equipamentos para o satélite-- que podem ter contribuído para a falha dos componentes. O principal deles diz respeito a um erro de projeto dos circuitos que trabalham em conjunto com os conversores DC/DC que falharam. De acordo com o relatório, estes circuitos estariam induzindo sinais anormais nos conversores, propiciando sua falha.

Ao que tudo indica, entretanto, a empresa fornecedora MDI teve responsabilidade pela falha nos componentes. A reportagem encontrou em um site indiano um artigo de 22 de outubro de 2010 que avalia o projeto do satélite Chandrayaan-1. Neste artigo faz-se menção à falha destes mesmos conversores DC/DC fabricados pela MDI.

Em tradução livre o artigo afirma que “o comitê também revelou, pela primeira vez, que um minúsculo componente de 110 gramas de apenas US$ 5 mil derrubou uma missão que custou US$ 100 milhões”. ‘Foi a formiga que matou o elefante’, observou um engenheiro da agência espacial indiana. Ainda segundo o artigo, “um componente chamado conversor DC/DC, muito parecido com um transformador pequeno, que havia sido importado de uma empresa americana, Modular Devices Inc., foi o que causou a falha.

Não um, mas cinco destes componentes falharam sequencialmente a bordo do Chandrayaan-1, causando a interrupção prematura da missão. Entretanto, o comitê de investigação apontou em seu relatório falhas por parte dos técnicos da própria agência espacial indiana evolvidos nas atividades de teste e garantia do produto, por não terem sido capazes de detectar a má qualidade do componente importado, vital para o funcionamento do satélite.” http://www.thehindu.com/opinion/lead/article841036.ece

Fazendo uma analogia com o caso ocorrido no programa espacial indiano, alguns questionamentos são imediatos, a saber:

1) a equipe técnica responsável pela condução dos testes de qualificação dos componentes importados, bem como o pessoal responsável pela garantia do produto, tanto do INPE quanto da Mectron, têm alguma responsabilidade por não haver detectado antes algum sintoma de falha dos conversores que veio a ocorrer mais tarde?

2) levando em conta que um número significativo de componentes apresentou falhas, a simples substituição destes por outros sobressalentes do mesmo lote não contribuiria para uma diminuição indesejável do nível de confiança do satélite, colocando em risco a própria missão, como ocorreu com o satélite indiano?

3) assumindo-se que houve erros tanto por parte da empresa fornecedora dos componentes (MDI), quanto do INPE e da Mectron (contratada para fabricar partes do satélite CBERS), quem deverá arcar com os gastos financeiros extras decorrentes da substituição das peças e retrabalho dos equipamentos? A União?

Engenheiros do INPE consultados pela reportagem comentaram possibilidades de solução para o dilema do lançamento do CBERS 3. As alternativas apontadas foram:

1) Levar os componentes à MDI, acompanhar a inspeção de cada um e ir corrigindo suas falhas: Pode ser uma solução mais rápida, mas como se trata de uma empresa que mostrou ter antecedentes de problemas que não foram sanados --vide o caso da Índia-- talvez possa ser um risco considerável.

2) Trocar de fornecedor, utilizando o serviço de um fabricante mais conceituado no mercado para este tipo de dispositivo: um alternativa mais segura, no entanto, demandaria mais tempo, pois ao adquirir componentes novos, seria necessário reanalisar e reprojetar as placas de circuito de todo o sistema, o que poderia levar a um atraso de até dois anos no lançamento do satélite.

A reportagem apurou ainda que está havendo muita pressão do MCTI, para que o CBERS-3 seja lançado o mais rapidamente possível (fala-se em fevereiro de 2013), como forma de se evitar desgastes políticos ainda maiores com os parceiros chineses. Entretanto, técnicos e engenheiros do INPE estão receosos de que se tome uma decisão pela pressa e cause o maior de todos os desastres para uma missão não tripulada: o não funcionamento do satélite em órbita.

O impasse é proporcional à gravidade do problema, e há rumores diversos no INPE sobre o desdobramento do fato. Inclusive, no dia 23 de outubro, os chineses foram ao Instituto para discutir um acordo sobre o que fazer com relação às falhas dos dispositivos DC/DC.

Mas, como esta parte do satélite é de responsabilidade do Brasil, teriam se eximido de opinar sobre o assunto para aguardar um posicionamento brasileiro sobre as próximas ações. Dias antes da visita chinesa, o ministro Marco Antonio Raupp (MCTI), esteve, sem aviso prévio, nas instalações do INPE reunido a portas fechadas com os responsáveis pelo programa CBERS, muito provavelmente para tratar dos desdobramentos das falhas dos conversores DC/DC ocorridas na China, bem como avaliar os impactos das mesmas sobre o cronograma de lançamento do satélite.

A direção do INPE foi procurada para comentar o assunto mas informou que preferia não emitir opinião neste momento.

Fonte: Jornal do SindCT

Comentários do blog: no início de setembro, publicamos a postagem "CBERS 3: lançamento ameaçado", informando sobre o problema no sistema de suprimento de energia do CBERS 3. Na ocasião, o blog Panorama Espacial foi prontamente atendido pelo diretor do INPE, Leonel Perondi, que prestou todos os esclarecimentos solicitados acerca do problema identificado. Perondi mencionou que teria um posicionamento sobre a extensão do atrasamento (caso ocorresse) até meados de setembro, conforme é mencionado na postagem. Desde o início de outubro, o blog tentou por diversas ocasiões um contato com o diretor do INPE para obter atualizações sobre o status da missão, sem no entanto ter sido atendido. Segundo sua assessoria, o diretor do INPE estaria sem agenda disponibilidade para nos atender.

A reportagem de Shirley Marciano traz uma informação interessante sobre o possível papel da Mectron na falha dos conversores. Em matéria de sistemas de suprimento de energia, o CBERS 3 não é o único problema da Mectron, que também tem enfrentado grandes dificuldades com um subsistema similar para a Plataforma Multimissão (PMM).
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domingo, 2 de setembro de 2012

CBERS 3: lançamento ameaçado


O lançamento do satélite de observação CBERS 3, previsto inicialmente para novembro ou dezembro deste ano, pode sofrer um atraso. O motivo são falhas identificadas em testes finais já em solo chinês, antes do envio para o centro de lançamento, em conversores DC/DC, itens que compõem o sistema de suprimento de energia do satélite.

Entre os dias 18 e 24 de agosto, cinco engenheiros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), incluindo o coordenador do Segmento Espacial do Programa CBERS, estiveram nos EUA para participar de reuniões técnicas "para esclarecer as não conformidades e as falhas do componente conversor DC/DC, fabricados pela empresa MDI [Modular Devices Incorporated], utilizados no satélite CBERS 3 e 4", segundo informações divulgadas no Diário Oficial da União de 17 de agosto.

Na última sexta-feira (31), o blog Panorama Espacial conversou sobre este assunto com Leonel Perondi, diretor do INPE. De acordo com o diretor, até meados deste mês haverá uma definição sobre um eventual atraso no lançamento, que depende do envio de um relatório do fabricante dos componentes objeto das falhas. "Há chance de sim, há chance de não", afirmou. Os componentes que apresentaram falhas foram adquiridos entre 2007 e 2008, e apesar de serem de origem norte-americana, não tiveram restrição do International Traffic in Arms Regulations (ITAR).

Perondi mencionou o caso do CBERS 2, segundo satélite do programa e que foi colocado em órbita em 21 de outubro de 2003. Aproximadamente um ano antes de seu lançamento, em testes realizados no centro espacial de Taiyuan, na China, foram identificadas falhas, coincidentemente, também em conversores DC/DC. Tais falhas causaram um significativo atraso no cronograma da missão, uma vez que houve a necessidade da troca de cerca de 400 componentes do satélite.

Colaborou Shirley Marciano.
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segunda-feira, 26 de março de 2012

"Brazil in space": VLS e CIA

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O website especializado The Space Review publicou um interessante artigo ("Brazil in space") sobre o interesse do governo norte-americano, por meio da Central Intelligence Agency (CIA), no programa brasileiro de foguetes e lançadores.

O interesse e preocupação por parte dos EUA com o programa brasileiro sempre foi conhecido e tem reflexos até hoje (restrições ITAR, por exemplo), e o artigo, embora não aprofunde o tema, apresenta um relatório produzido pela CIA no início da década de oitenta, alguns anos após o lançamento oficial do projeto do Veículo Lançador de Satélites (VLS), como parte da Missão Espacial Completa Brasileira (MECB).

Para quem se interessa pelo tema, vale a leitura, em especial do relatório preparado pela agência de inteligência. Clique aqui para acessá-lo.

Agradecimentos a Nivaldo Hinckel pelo envio do link.
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domingo, 9 de outubro de 2011

Satélites 2011: informações sobre o SGB

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Durante o Congresso Latino-Americano de Satélites, que aconteceu no Rio de Janeiro entre os dias 6 e 7 de outubro, a apresentação certamente mais aguardada e que mais interessava aos presentes foi a última, sobre o Satélite Geoestacionário Brasileiro (SGB), num enfoque de Defesa ("O Novo Projeto da Indústria Aeroespacial Brasileira; O papel do satélite na Defesa; Complementariedade Governo/Iniciativa Privada"). Representantes do Ministério da Defesa, da Agência Espacial Brasileira (AEB) e do Comando da Aeronáutica, além de executivos da indústria fizeram apresentações com visões e propostas para o tão aguardado projeto.

A transformação do SISDABRA

O general Celso José Tiago, do Ministério da Defesa, apresentou um panorama sobre satélites para a Defesa, em linha com as diretrizes da Estratégia Nacional de Defesa (END). Conforme esperado, discorreu brevemente sobre os projetos do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (SISFRON), e do Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (SisGAAz), que demandarão capacidade espacial, não apenas em comunicações, mas também em navegação, meteorologia e observação terrestre. De acordo com o general, o projeto básico do SISFRON está muito próximo de ser concluído, e pelos planos do governo, deve começar a ser implantado a partir de 2013, com um horizonte de dez anos.

Mas, o cerne da apresentação do general Tiago esteve no que ele chamou de transformação do Sistema de Defesa Aeroespacial Brasileiro (SISDABRA), onde o SGB acaba se inserindo. Hoje preocupado com a proteção do espaço aéreo, o sistema será transformado e passará a também se preocupar com o segmento espacial, em linha com os ditames da END: "O SISDABRA (...) disporá de um complexo de monitoramento, incluindo veículos lançadores, satélites geoestacionários e de monitoramento, aviões de inteligência e respectivos aparatos de visualização e de comunicações, que estejam sob integral domínio nacional."

Muito embora não pareça haver uma definição oficial sobre as especificações do primeiro satélite, os comentários convergem para o seguinte: um satélite de grande porte, em torno de cinco toneladas, com transpônderes em banda Ka (foco no atendimento ao Plano Nacional de Banda Larga), e X (comunicações governamentais e militares). Uma fonte governamental comentou com o blog que o Ministério da Defesa possivelmente também fará uso da capacidade em banda Ka, adequada para comunicações com veículos aéreos não tripulados (VANTs). De acordo com o general Tiago, o objetivo é que o SGB ocupe uma posição orbital que lhe permita cobrir o Atlântico, o continente africano e o Mediterrâneo [na semana passada, partiu do Rio de Janeiro uma fragata da Marinha do Brasil que participará de uma missão das Nações Unidas no Líbano, na região do mediterrâneo. Tal fragata fará uso de sistemas comerciais de comunicação via satélite, possivelmente Inmarsat, para as comunicações com o governo/Marinha].

As movimentações empresariais

A expectativa do governo é de que até o final desse ano, seja selecionada uma empresa brasileira para atuar como contratante principal do SGB. Nesse sentido, já ocorrem movimentações empresariais, e segundo rumores, Odebrecht, Embraer Defesa e Segurança, Schahin e Andrade Gutierrez são alguns dos grupos interessados em atuar no projeto.

Paralelamente à definição sobre o contratante principal, os fabricantes também se movimentam. Vários executivos de fabricantes estrangeiros estavam presentes no evento. Laurent Mourre, diretor geral da Thales no Brasil, apresentou o histórico e experiência da Thales Alenia Space (joint-venture da Thales com o grupo Finmeccanica, da Itália) em satélites militares de comunicações. Mourre defendeu a ideia de que um único fornecedor de satélites seja contratado, e também falou sobre a possibilidade de transferência tecnológica para indústrias brasileiras a serem envolvidas nos próximos satélites da rede. "Estamos dispostos a apoiar iniciativas da indústria brasileira que visem ao atendimento das necessidades do país", afirmou.

A Astrium, do grupo EADS, liderada no País pelo experiente executivo Jean-Noel Hardy, também se posiciona como forte candidata.

Uma proposta conjunta por diferentes fabricantes, inclusive, não pode ser descartada, pelo que o blog ouviu de algumas pessoas bem familiarizadas com o tema.

Indicando o caráter estratégico do projeto para as relações Brasil e França, convém destacar que a "cooperação em matéria de sistemas satelitais geoestacionários" é um dos itens que constam da parceria estratégica firmada entre os governos brasileiro e francês em dezembro de 2008. Outro indicativo do grande interesse francês pelo projeto é a visita do general Tiago, do Ministério da Defesa, às dependências do projeto de satélites militares da série SYRACUSE, na França, por ocasião da 6ª Reunião do Grupo de Trabalho Conjunto Brasil - França, que acontecerá na segunda quinzena desse mês, conforme publicado na última sexta-feira (07) no Diário Oficial da União.

A questão da transferência tecnológica

Ponto que tem gerado muita confusão sobre o SGB é a tão falada transferência de tecnologia. Fato é que, para se atender o objetivo de tê-lo em órbita em 2014, o primeiro satélite será integralmente contratado no exterior, sem envolvimento industrial nacional no segmento espacial. Há, no entanto, a expectativa de que empresas brasileiras participem do segmento solo (estações de controle e recepção), atividades de engenharia de sistemas e concepção da rede, dentre outros trabalhos associados. Para os próximos satélites, a serem lançados a partir do final da década, espera-se que a indústria brasileira seja capaz de participar, fornecendo componentes, efetuando testes ou mesmo atuando como integradoras. É por este motivo que a AEB foi chamada para participar do projeto, devendo zelar e tomar as medidas necessárias para que haja algum desenvolvimento industrial com base no SGB.

A intenção do governo, conforme revelado ao blog por uma fonte governamental, é de que no futuro o Brasil disponha de uma contratante principal de satélites, não apenas os de comunicações para o SGB, mas também de observação terrestre e de outras finalidades para atenderem as necessidades do País. Inclusive, um modelo de prime contractor apresentado pela AEB aos outros setores do governo é o da argentina INVAP. Este é um assunto que o blog voltará a abordar em breve.

Com o primeiro satélite, contratado no exterior, a intenção é a de que haja absorção tecnológica, segundo disse Himilcon Carvalho, diretor de política espacial e investimentos estratégicos da AEB. Isto é, a contratante principal deverá adquirir capacidade e conhecimento para o gerenciamento de projetos e sistemas, controle do satélite, dentre outros aspectos relacionados a sua operação. Basicamente, seria a mesma capacidade hoje detida no Brasil pela Star One, da Embratel, que contrata e opera diretamente os seus satélites, com competência nessas áreas internacionalmente reconhecida.

Uma proposta da ACS?

A binacional Alcântara Cyclone Space (ACS), na pessoa de seu Chief Commercial Officer, Sergiy Guchenkov, chamou a atenção ao apresentar sua proposta, turn-key para o SGB, isto é, adquirir o satélite, montar e o sistema e entregá-lo para o operador já em órbita. Ao invés de se fazer de início um satélite de maior porte, como planejado, sua proposta é que sejam construídos dois satélites menores, de massa inferior a 1.700 kg, possibilitando o lançamento pelo Cyclone 4 a partir do Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão, e também viabilizando um back-up para o sistema. De acordo com Guchenkov, o total de recursos disponível para o projeto (R$ 716 milhões) seriam suficientes para a construção dos dois satélites, assim como de seu lançamento, com total transferência de tecnologia para o País. A ACS disporia, ainda, de parceiros industriais na área de satélites com capacidade para desenvolvê-los e construi-los dentro do prazo necessário. O blog Panorama Espacial questionou o executivo sobre quem seriam estes parceiros, perguntando se a canadense MDA, que já está construindo um satélite de comunicações para o governo ucraniano, seria uma delas. Guchenkov confirmou o nome da MDA, mas afirmou que também existem outros parceiros. O executivo destacou também que os satélites poderiam ser financiados externamente, com garantia soberana do Brasil, sem necessidade de se aplicar recursos orçamentários do governo.

Apesar de ainda não serem conhecidos muitos detalhes, um ponto que talvez mereça especial consideração da proposta da ACS é a eventual necessidade de um acordo de salvaguardas tecnológicas com o governo dos EUA para o lançamento de satélites a partir do Brasil, associada com a questão do International Traffic in Arms Regulation (ITAR), tema frequentemente abordado aqui no blog. Havendo um eventual envolvimento da MDA na construção do satélite, dificilmente estes serão "ITAR-free", isto é, sem componentes de origem norte-americana, o que dificultaria o seu lançamento pela ACS no Brasil sem a existência de salvaguardas bilaterais entre EUA e Brasil. Ainda, importante ressaltar que soluções "ITAR-free" costumam ter um custo mais elevado e, muitas vezes, não têm a necessária maturidade tecnológica, o que seria um risco adicional ao sistema. Imagina-se que o governo brasileiro levará em consideração todos estes aspectos e riscos quando a decisão for tomada.
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quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Boeing se estabelece no Brasil

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Ontem (28), a companhia norte-americana Boeing anunciou a indicação de Donna Hrinak, ex-embaixadora no Brasil, para dirigir o novo escritório do grupo em São Paulo. A nomeação, que será efetiva a partir de 14 de outubro, "expande ainda mais a presença da Boeing no Brasil e reforça o compromisso da empresa com clientes, indústria e governo", afirmou a companhia em nota.

Dentre as responsabilidades de Hrinak, destacam-se o desenvolvimento e implementação da estratégia da Boeing no País, relações governamentais, identificação de oportunidades de negócios novos e emergentes, e relacionamento da empresa com clientes e parceiros.

"O Brasil é uma das economias que mais cresce no mundo e representa para a Boeing um grande mercado de produtos e serviços com fontes ricas em colaborações atuais e futuras nas áreas de tecnologia, indústria e finanças”, declarou Shep Hill, presidente da Boeing International e vice-presidente sênior de Desenvolvimento de Negócios e Estratégias.

No Brasil, a Boeing participa do Programa F-X2, da Força Aérea Brasileira, e é também importante fornecedora de aeronaves comerciais para companhias aéreas, como a Gol e TAM. Recentemente, a unidade espacial do grupo também participou da licitação promovida pela Star One, do grupo Embratel, para o fornecimento de um satélite de comunicações, e vê ainda várias oportunidades no País, especialmente junto ao governo, considerando as diretivas da Estratégia Nacional de Defesa.

Em agosto, num encontro com a imprensa especializada, Christopher Raymond, vice-presidente executivo de Estratégias & Desenvolvimento de Negócios, afirmou que no campo espacial existem oportunidades locais em "hosted payloads" para comunicações (ver a postagem "Boeing, Programa F-X2 e satélites"). O executivo não deu mais detalhes, mas supõe-se que a oportunidade esteja no campo de comunicações governamentais e militares, especialmente considerando-se a decisão do governo em definitivamente lançar o programa do Satélite Geoestacionário Brasileiro (SGB). A empresa é vista como potencial interessada na concorrência a ser em breve lançada.

Nos EUA, existe a expectativa de que as regras do International Traffic in Arms Regulations (ITAR), conjunto de normas que, grosso modo, controlam a exportação de tecnologias militares e duais, sejam flexibilizadas, especialmente na área de satélites, o que, em tese, favoreceria as fabricantes de satélites e componentes, dentre elas a Boeing. Sobre esse tema, recomendamos a leitura da reportagem "Recovering from ITAR: Possibly Tough for U.S. Satellite Industry", publicada na edição de setembro da revista Via Satellite.
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terça-feira, 5 de abril de 2011

Brasil, China e CBERS

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Brasil quer parceria maior com a China para construir satélites

Sergio Leo
De Brasília

O governo brasileiro aproveitará a visita da presidente Dilma Rousseff à China para discutir com os chineses a ampliação do programa de cooperação em matéria de satélites. O programa sofreu atrasos e o próximo lançamento, do satélite conhecido como CBERS-3, programado originalmente para 2009, deverá ser adiado, mais uma vez, para 2012. Ainda assim, é apontado como o mais bem sucedido programa de cooperação científica e tecnológica entre países emergentes e tem incentivado o desenvolvimento de equipamentos sofisticados em empresas brasileiras.

"Queremos diversificar, ver possibilidades de trabalho conjunto com a China", disse o diretor de Satélites, Aplicações e Desenvolvimento da Agência Espacial Brasileira (AEB), Thyrso Villela. O programa CBERS, hoje, é voltado à construção de satélites para captação de imagens da superfície da Terra, com aplicações na agricultura, no controle de desmatamento, na atuação contra catástrofes naturais e em outras atividades sujeitas a sensoriamento remoto.

A AEB acredita que pode aumentar a cooperação com os chineses em técnicas de sensoriamento remoto, interpretação de dados e estudos científicos como os realizados sobre o clima espacial. "Queremos intercâmbio de técnicos, simpósios, cursos mais extensos, de onde podem surgir outras ideias importantes para a diversificação", acrescenta o chefe da assessoria de Cooperação Internacional da AEB, Carlos Campelo. A cooperação em ciência e tecnologia será objeto de um seminário, com a presença da presidente.

O programa de cooperação entre chineses e brasileiros teve de enfrentar bloqueio de componentes sensíveis por parte dos Estados Unidos, onde a lei de controle no tráfico de armas (Itar) proíbe a venda de produtos americanos com determinadas tecnologias passíveis de uso militar. É forte a sensibilidade no Congresso e no Executivo americanos contra a venda de componentes e artefatos eletrônicos sofisticados à China e subsistemas criados no Brasil para o satélite binacional sofreram atrasos e remodelações provocadas pelo veto ao embarque de componentes comprados e faturados de firmas americanas.

"Não é simples, há uma lista de produtos sujeitos ao Itar, mas ela é constantemente atualizada", diz Vilella. A proibição de compra de um componente pode exigir o redesenho de todo um equipamento, como ocorreu com a Opto, firma brasileira de artefatos ópticos para uso médico que, após trabalhar com o Centro Tecnológico da Aeronáutica para desenvolvimento de mísseis teleguiados, foi escolhida, em concorrência, para fabricar câmeras para os satélites sino-brasileiros. "Houve componentes que compramos, pagamos e, quando iam ser embarcados, o fornecedor nos telefonou avisando que não poderia nos enviar a encomenda", diz o diretor-comercial da Opto, Antônio Fontana.

O veto americano acabou servindo de estímulo para desenvolvimento de tecnologia nacional, "Itar free", ou livre de risco de embargo, como foi classificada a câmera apresentada no ano passado pela Opto, para o CBERS-3. Obrigados a trocar componentes eletrônicos por circuitos, maiores, os técnicos da empresa usaram o conhecimento em óptica para reduzir o tamanho das lentes da câmera.

O programa espacial hoje responde por 30% a 50% do faturamento da empresa, que chegou a pouco mais de US$ 70 milhões em 2010. A tecnologia desenvolvida para o satélite já foi usada em artefatos para uso médico, como o laser de uso oftalmológico.

Os atrasos no programa espacial levaram a AEB a aproveitar equipamentos criados para o CBERS-2 para enviar ao espaço, em 2007 o CBERS-2B, em lugar do CBERS-3, que se pensou em lançar ainda em 2009. O CBERS-3, primeiro a ter 50% de componentes feitos no Brasil, nos testes recentes, mostrou problemas em um de seus subsistemas, chamado pelos técnicos de "atitude", que permite ao satélite controlar a direção em que são apontados seus instrumentos. Foi um dos motivos para se decidir pelo adiamento de sua colocação em órbita, para 2012.

Fonte: jornal Valor Econômico, via NOTIMP.
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domingo, 27 de fevereiro de 2011

Sistemas de controle, CCDs e etc.

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Em 28 de fevereiro, será inaugurado no Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), em São José dos Campos (SP), o Laboratório de Identificação, Navegação, Controle e Simulação, construído com recursos da FINEP para apoiar atividades de desenvolvimento de sistemas de navegação e controle de satélites e veículos lançadores.

Na última sexta-feira (25), uma reportagem ("Laboratório reduz gargalo espacial") de Virgínia Silveira com informações detalhadas sobre as finalidades do laboratório e projetos do Brasil no campo de sistemas de controle aeroespacial foi publicada no jornal "Valor Econômico".

Sistemas inerciais e de controle, aliás, sempre foram o "calcanhar de Aquiles" de muitos projetos espaciais, particularmente em veículos lançadores. Por ser um item de uso dual (tanto para lançadores espaciais como mísseis balísticos), sua comercialização é muito controlada. Em julho de 2008, publicamos um pequeno artigo no blog sobre a história do desenvolvimento local e posterior compra de sistemas inerciais russos para o VLS (veja em "Sistemas Inerciais: o calcanhar-de-aquiles do VLS").

Além de sistemas de controle, existem vários itens sensíveis para o desenvolvimento autônomo de tecnologia espacial. Um exemplo crítico são os detectores CCD (Charge-Coupled device / dispositivo de carga acoplada) para câmeras óticas espaciais, que não são fabricados localmente e precisam ser importados. Para câmeras de resolução mais apurada (a partir de 5 metros), a aquisição no exterior é ainda mais difícil. Os EUA, por exemplo, costumam restringir a venda em razão de sua legislação interna (ITAR).

Alguns movimentos de consolidação entre as empresas fornecedoras de CCDs têm tornado mais difícil a compra desses componentes. A companhia inglesa E2V adquiriu várias fabricantes na Europa, como a unidade da Atmel em Grenoble, na França, em 2006, fornecedora, aliás, dos CCDs das câmeras MUX e WFI dos CBERS 3 e 4. Mais recentemente, em janeiro deste ano, o grupo britânico BAE Systems adquiriu o controle da Fairchild Imaging, fabricante norte-americana de CCDs e de outros componentes óticos.

Há algumas alternativas para as dificuldades em compra de itens críticos. Uma delas é o chamado "up-screening" que, grosso modo, consiste em utilizar técnicas de seleção de componentes eletrônicos para aproveitar componentes de uma categoria inferior, disponíveis comercialmente, por exemplo, em uma aplicação que demandaria outras de categoria superior.

Os exemplos dos sistemas inerciais e dos CCDs mostram que, se o objetivo é buscar independência e autonomia (caso do Programa Espacial Brasileiro), não basta apenas pensar nas plataformas (lançadores e satélites), mas também nos subsistemas e componentes críticos.
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sábado, 12 de fevereiro de 2011

ANÁLISE: Programa F-X2, Boeing, EUA e satélites

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No último dia 8, a Reuters divulgou uma reportagem, intitulada "Brasil quer melhores condições para caças da Boeing, diz fonte", afirmando que para a presidente Dilma Rousseff, o caça F-18 E/F Super Hornet, da Boeing, seria a melhor opção para o Programa F-X2, da Força Aérea Brasileira (FAB). O texto tem um parágrafo curioso, pois cita o campo de satélites como uma das áreas de possível cooperação caso os americanos ganhem a concorrência: "Ela [Marcia Costley, porta-voz da Boeing] acrescentou que, como parte de eventual negócio, a empresa norte-americana estaria disposta a fornecer ao Brasil também tecnologia e outros tipos de assistência em áreas como transportes, satélites e sistemas bélicos."

A esta reportagem, seguiram-se outras. Em 10 de fevereiro, no jornal "O Globo", o colunista Merval Pereira publicou um artigo ("Desconfianças") destacando a preocupação de Brasília quanto à transferência de tecnologia caso os americanos ganhassem. Num trecho, Pereira faz afirmações empíricas: "Houve problemas com os militares brasileiros nos últimos 30 anos, especialmente com a Aeronáutica, que teve projetos seus dificultados por embargos dos americanos a desenvolvimentos tecnológicos ligados a mísseis e satélites."

Merval Pereira não detalha as restrições americanas, fundamentadas numa legislação interna dos EUA, a International Traffic in Arms Regulations (ITAR), tema que eventualmente abordamos no blog.

Hoje (12), a "Folha de S. Paulo" publicou uma reportagem ("EUA acreditam ter assumido dianteira na venda dos caças") destacando o otimismo do governo norte-americano com a possível venda do Super Hornet para a FAB.

Em fevereiro de 2009, publicamos uma postagem com uma análise das consequências para o Brasil na hipótese da reforma da ITAR, assunto já há alguns anos em discussão em Washington. Além dessa mudança normativa, e talvez até mais importante do que ela, o possível comprometimento norte-americano com uma inédita transferência tecnológica, motivado pelo interesse na venda dos caças, tem o condão de trazer significativos benefícios para a indústria de defesa e o setor espacial brasileiro. A menção a satélites (comunicações?) é um claro indicativo disto.

Recentemente, o governo americano, numa linha pragmaticamente comercial (no setor de defesa, apenas para a Boeing, a perspectiva é de mais de 30 bilhões de dólares em negócios com a Índia nos próximos dez anos), levantou restrições de exportação de avançadas tecnologias a instituições de pesquisas indianas das áreas de defesa e espacial (dentre elas, a ISRO), num exemplo que demonstra até onde os EUA estão dispostos a chegar.

A oferta da Boeing também evidencia como um programa de aquisição de defesa pode ter reflexos significativos em outros setores não diretamente relacionados, como o espacial. Uma vitória americana poderia ter um efeito devastador nos esforços de governos e empresas, especialmente europeus, em parcerias com o Brasil no campo de satélites.
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sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Restrições do ITAR ao Programa Espacial Brasileiro

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O blog tem abordado com frequência as consequências da legislação ITAR (International Traffic in Arms Regulations), dos EUA, ao Programa Espacial Brasileiro. O assunto, aliás, é costumeiramente objeto de conversas em encontros do blog com autoridades do Programa brasileiro e indústrias nacionais e estrangeiras.

Desde o início do ano, o blog conversou com duas indústrias sobre as restrições impostas pelo ITAR, e alguns pontos mencionados merecem comentários. A regulação norte-americana não tem afetado apenas o programa CBERS, desenvolvido em parceria com a China, mas também outros projetos brasileiros de satélites, como o de observação terrestre Amazônia-1. Essa constatação, prática, diga-se de passagem, é no mínimo curiosa, já que as restrições dos EUA ao Brasil em matéria de satélites sempre foram muito direcionadas ao projeto com a China, por causa de problemas passados (vejam a postagem "A face comercial da ITAR", de março de 2009), e não aos projetos nacionais. O mesmo não ocorre, como já foi tratado aqui, com o programa de lançadores e foguetes brasileiros (vejam "Embargos dos EUA ao Programa Espacial Brasileiro"), em que restrições e vetos são de praxe.

O efeito prático do ITAR, contrariando a sua razão de existir, é que, além de prejudicar a indústria americana (a própria participação da Boeing na concorrência F-X2, da Força Aérea Brasileira, prejudicada pelas alegações do governo de que Washington não transfere tecnologia é exemplo), indústrias estrangeiras, em particular a europeia, se beneficiem (muitas vezes, com preços bem superiores) com novos clientes. Há exemplos também, inclusive no Brasil, de empresas que tiveram veto na compra de componentes dos EUA, e que por esta razão desenvolveram soluções locais.

Numa das conversas com o blog, um caso interessante, não associado ao ITAR, mas sim à paranoia americana foi relatado. Trata-se de empresa brasileira que tem seu IP bloqueado no acesso virtual ao web-site da biblioteca da National Aeronautics and Space Administration (NASA). Evidentemente, o bloqueio de nada adiantou, pois a empresa encontrou outro meio para acessar o banco de dados da agência espacial americana.
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sábado, 28 de novembro de 2009

CBERS, China e EUA

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O governo norte-americano continua a apontar o Programa Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres (CBERS) como um projeto com aplicações militares. Já há alguns anos, este entendimento tem sido explicitado em relatórios do Pentágono, Forças Armadas e "think tanks" ligados ao governo. O relatório anual ao Congresso de 2009 sobre a força militar da República Popular da China ("Annual Report to Congress - Military Power of the People's Republic of China - 2009"), preparado pelo Departamento de Defesa, menciona explicitamente (página 26) o CBERS como satélite com aplicações militares:

"Reconhecimento: a China está operando sistemas avançados de imageamento, reconhecimento e recursos terrestres com aplicações militares. Examplos incluem os satélites Yagogan-1, -2, -3, -4, e -5, o Haiyang-1B, o CBERS-2 e -2B, e a constelação de satélites de monitoramento ambiental e de desastres Huanjing." ("Reconnaissance: China is deploying advanced imagery, reconnaissance, and Earth resource systems with military applications. Examples include the Yaogan-1, -2, -3, -4, and -5, the Haiyang-1B, the CBERS-2 and -2B satellites, and the Huanjing disaster/environmental monitoring satellite constellation.")

Um dos argumentos que sustentam a legislação ITAR (International Traffic in Arms Regulations), dos EUA, e suas restrições à compra de componentes espaciais e duais por institutos e indústrias brasileiras envolvidas no CBERS é justamente essa suposta aplicação militar pelo lado chinês. É interessante observar que o ITAR passou a ser bem mais rígido em razão de episódio em meados da década de noventa que envolveu a China: transferência de conhecimento técnico por indústrias espaciais norte-americanas sobre tecnologia de guiagem de foguetes por ocasião de sucessivas falhas nos lançamentos de foguetes chineses da família Longa Marcha.

Apesar do posicionamento americano sobre o viés militar de vários projetos espaciais chineses, há algumas semanas, durante visita de Barack Obama ao país asiático, foi divulgado comunicado conjunto sobre a intenção dos dois países em expandir a cooperação em matéria de ciência espacial, além de dar início a um "diálogo" sobre missões espaciais tripuladas. Alguns dias após a divulgação do comunicado, tornou-se público um relatório do Pentágono apontando uma escalada da China em casos de espionagem contra os EUA, com uso de métodos cada vez mais sofisticados, como guerra cibernética e técnicas mais elaboradas de recrutamento de espiões.
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terça-feira, 3 de novembro de 2009

Resenha do livro sobre o Programa CBERS

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Em 10 de outubro, mencionamos no blog o lançamento de “Brasil – China - 20 anos de Cooperação Espacial: CBERS – O Satélite da Parceria Estratégica”, livro oficial sobre o programa do Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres (CBERS, sigla em inglês), e também dissemos que faríamos uma pequena resenha, apresentada a seguir.

A obra, de alta qualidade gráfica e em versão bilíngüe (português, inglês) é assinada por Fabíola de Oliveira, jornalista científica já experimentada no tema, e autora do livro "O Brasil chega ao espaço", sobre o primeiro satélite construído no País, o SCD-1 (o blog também irá resenhar esta obra em breve).

A obra está dividida em quatro capítulos principais, além da apresentação (feita pelo ministro Sérgio Resende), prefácio (do ministro Celso Amorim), impressões e momentos da história: “O Início da Cooperação”; “As Dificuldades e a Superação”; “O Lançamento do Primeiro Satélite”; e “A Consolidação do Programa”.

1. “O Início da Cooperação”

No primeiro capítulo do livro, é apresentado breve histórico sobre o surgimento das atividades espaciais no Brasil, com a criação do Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (GOCNAE) em agosto de 1961, e também sobre os acordos de cooperação científica firmados com o governo chinês, e que acabaram culminando no Programa CBERS, resumidos abaixo.

Em março de 1982, foi assinado um acordo de cooperação científica e tecnológica com a China, documento ajustado em maio de 1984, quando se passou a constar expressamente a área espacial como uma das áreas de interesse. Em dezembro de 1984, houve uma primeira aproximação para se discutir a cooperação específica em espaço, com uma visita de delegação brasileira à Beijing.

Em 1986, após reuniões iniciais entre representantes dos órgãos espaciais dos dois países, já estava estabelecida a intenção de se levar adiante um programa de desenvolvimento de satélites de observação terrestre. Em fevereiro de 1987, uma primeira visita técnica brasileira é enviada à China, ocasião em que representantes chineses apresentam aos brasileiros o projeto de um satélite de observação de recursos terrestres. O projeto então passa a ser discutido, tendo sido produzido um primeiro relatório de trabalho entre o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e a CAST definindo as linhas mestras do projeto, em março de 1988. Nesse mesmo ano, em julho, o projeto foi oficializado com a assinatura do "Protocolo sobre Aprovação de Pesquisa e Produção de Satélite de Recursos da Terra, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Popular da China".

2. “As Dificuldades e a Superação”

Em agosto de 1988, um grupo de engenheiros e técnicos do INPE foi enviado à China para uma temporada de quase dois meses de início dos trabalhos técnicos. Fabíola de Oliveira relata as primeiras dificuldades, como o idioma e procedimentos. O idioma oficial escolhido foi o inglês, o que não foi fácil para os chineses, que tinham dificuldades com a língua.

Os procedimentos de trabalho da parte chinesa também surpreenderam os brasileiros. Toda a documentação era preparada em chinês e não seguiam os padrões internacionais, do Ocidente, aos quais os brasileiros estavam familiarizados (os engenheiros brasileiros participantes do início do projeto em sua maioria haviam estudado fora do País, onde fizeram mestrado ou doutorado, tendo, portanto, facilidade com a língua inglesa e também conhecimento dos padrões internacionais adotados pela NASA e ESA).

Uma “dificuldade” não relatada no livro, mas que o editor do blog já ouviu em rodas de conversas do pessoal envolvido no programa foi a comida, bastante diferente do padrão brasileiro. Qualquer dia, postaremos aqui a história das “small snakes”...

No início, o programa avançava relativamente bem, sem problemas de orçamento ou natureza política, mas já em 1989 começaram a surgir maiores dificuldades, como políticas e econômicas, e como consequência, desmotivação do pessoal envolvido. Mudanças na direção do INPE e no Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) afetaram sensivelmente o programa, situação que só passou a melhorar após o afastamento do presidente Fernando Collor, a partir do segundo semestre de 1992.

Do lado chinês, a truculenta ação contra as manifestações na Praça da Paz Celestial em 1989 foi um momento difícil. O Brasil se opôs às ações de força, mas não rompeu qualquer acordo com a China, o que fortaleceu a posição brasileira de parceiro confiável, contribuindo para a continuidade do projeto, apesar dos atrasos. Roberto Abdenur, na época embaixador do Brasil na China, revela no livro que, por duas vezes, os chineses expressaram intenção de afastar o Brasil do programa, em razão dos atrasos e de seus problemas internos.

A retomada do CBERS ocorreu de fato em 1993, quando da assinatura de protocolo tratando de pontos como os recursos para lançamento do primeiro satélite, integração e testes do segundo satélite da série no Brasil, controle em órbita compartilhado, entre outros.

3. “O Lançamento do Primeiro Satélite”

Em 1993, também foram assinados protocolos adicionais relacionados ao programa: um tratando do lançamento de microssatélite científico brasileiro como carga extra (“piggyback”) junto com o CBERS 1, e outro com escopo de ampliação da cooperação bilateral em matéria de espaço em itens como comunicações, lançamento de satélites, microgravidade, ciências atmosféricas e astrofísica, entre outros. Como escreveu Fabíola de Oliveira, “O tempo veio demonstrar que o programa de cooperação não seria tão abrangente como se imaginava naquele momento.”

Os dois países analisaram a viabilidade de desenvolver em conjunto um satélite de comunicações, mais complexo que o CBERS, tendo ocorrido viagens para a discussão da iniciativa, que não vingou por dificuldades políticas e econômicas.

No penúltimo capítulo, é mencionada a falência da Esca, indústria brasileira contratada para fornecer vários componentes para o CBERS, fato ocorrido no primeiro semestre de 1995. Este fato resultou em novos atrasos no programa.

O livro tem uma marcante frase de Roberto Abdenur, que estava na comitiva brasileira que assistiu ao lançamento do primeiro satélite da série, em 14 de outubro de 1999: “Nós, diplomatas, não vemos com freqüência a materialização de nosso trabalho diplomático. Assistir ao lançamento do satélite CBERS-1 foi uma das emoções mais fortes de minha vida.”

4. “A Consolidação do Programa”

O último capítulo do livro trata de história mais recente e, portanto, mais conhecida sobre o Programa CBERS: o protocolo complementar para a construção dos CBERS 3 e 4; lançamento do CBERS 2; acordo para a construção do CBERS 2B; distribuição gratuita de imagens; lançamento do CBERS 2; entre outros acontecimentos.

Nesse capítulo, é também mencionada a expectativa de continuidade do programa após os satélites da segunda série. Inclusive, Chen Duqing, Embaixador da República Popular da China no Brasil, em depoimento publicado no livro, diz (destaque do blog): “Com o forte apoio dos Governos e dignatários dos dois Países, a cooperação em torno do CBERS tem alcançado constantes avanços. Até o momento, já foram lançados três satélites (CBERS 1, 2 e 2b) para a órbita da Terra. Os trabalhos referentes à pesquisa e fabricação dos CBERS 3 e 4 estão sendo felizmente levados a efeito. E os CBERS 5 e 6 vão ser colocados na agenda.”

Algumas críticas

É louvável a iniciativa de publicar livros sobre projetos do Programa Espacial Brasileiro, e a qualidade da obra assinada por Fabíola de Oliveira é inquestionável. Isso não nos impede, porém, de fazer algumas críticas.

A bibliografia consultada é quase que unicamente oficial, como instrumentos diplomáticos e atas de reuniões do comitê conjunto. Existem hoje no Brasil estudos de grande qualidade sobre o CBERS, inclusive acadêmicos (da UNICAMP, o blog se recorda de ao menos três), que não foram consultados. Assim, o livro não pode ser considerado independente, o que é até lógico por ter sido patrocinado pelo MCT, AEB e INPE.

Alguns pontos críticos do programa não foram abordados, ou se foram, de forma muito superficial. Mencione-se, por exemplo, a questão das restrições dos EUA à importação de componentes para os satélites (legislação ITAR), o acordo de compensação industrial fechado (e não cumprido devidamente) pela parte chinesa, as dificuldades da indústria brasileira em cumprir alguns contratos, entre outros.
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sábado, 29 de agosto de 2009

Ensaios da rede pirotécnica do VLS-1

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Ensaios de interface da rede pirotécnica do VLS-1

28/08/2009

Foram realizados com sucesso os ensaios de interface da rede pirotécnica do VLS-1, em parceria com a empresa PyroAlliance, entre os dias 20 e 27 de agosto. Foram avaliados os sistemas de ignição dos Propulsores de Indução de Rolamento (PIR), sistema de ignição dos propulsores principais e sistemas de corte de separação do 1º estágio e sistema de destruição do veículo.

Estiveram envolvidos nestes ensaios as equipes da APE-X, AIE [Divisão de Integração e Ensaios] e três representantes da empresa PyroAlliance.

Fonte: IAE/CTA

Comentários: o IAE/CTA tem periodicamente realizado ensaios e testes relacionados ao VLS-1, etapas necessárias para o lançamento do VLS-1 XVT 01 em 2010 ou 2011.

A PyroAlliance é uma empresa do grupo francês SNPE especializada no desenvolvimento e fabricação de sistemas pirotécnicos para os setores aeronáutico, de defesa, industrial e espacial. Como a empresa informa em seu web-site, nenhum de seus produtos está sujeito às restrições do ITAR (International Traffic Arms Regulations), dos EUA, certamente uma das razões por ter sido escolhida pelo Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) para participar do programa de lançadores brasileiros.

Ainda em se tratando de pirotecnia espacial, a empresa francesa Dassault Aviation, fabricante do caça Rafale ofereceu em seu pacote de transferência de tecnologia para a concorrência F-X2, da Força Aerea Brasileira, aplicativos específicos desse tipo de tecnologia (leia mais sobre a oferta da Dassault clicando aqui). A Dassault fornece os dispositivos pirotécnicos (ignição dos propulsores, separação de estágios e de cargas úteis, e eventual destruição do lançador) usados no lançador europeu Ariane 5.
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quarta-feira, 26 de agosto de 2009

EUA: mudança de paradigma

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Várias reportagens publicadas na imprensa sobre o lançamento sul-coreano trazem uma interessante afirmação de Ian Kelly, porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, sobre o programa do país asiático. "Os sul-coreanos desenvolveram o seu programa de modo muito aberto e transparente, de acordo com os compromissos internacionais que eles assinaram", disse Kelly.

Seria esta afirmação do governo norte-americano simplesmente palavras simpáticas a um grande aliado na Ásia, ou uma mudança de paradigma dos EUA em relação a programas locais de lançadores?

Os Estados Unidos sempre foram muito críticos sobre programas locais de lançadores desenvolvidos por nações emergentes (ou terceiro-mundistas, usando o conceito do período da Guerra Fria), como o Brasil (Programa VLS), a Argentina (Condor), a África do Sul, e o Egito (Badr-2000), entre outros, por receio do eventual uso da tecnologia dual para propósitos militares. Vários países acabaram desistindo de seus projetos, mas alguns continuam a tocá-los, como o Brasil.

Em meados da década de noventa, com o objetivo de esclarecer e formalizar as intenções brasileiras na área de lançadores, o governo Fernando Henrique Cardoso assinou e ratificou alguns compromissos internacionais na área, como o Missile Technology Transfer Regime (MTCR). Isto por si só já seria elemento para caracterizar o Programa VLS como “aberto e transparente”.

Independente de qual seja a real motivação do posicionamento americano sobre o lançamento sul-coreano, o fato é que a cada dia que se passa notam-se pequenas mudanças na política dos EUA sobre questões sensíveis em áreas entendidas como duais, como a de lançadores espaciais, no comércio e transferência de tecnologia aeroespacial e militar. O interesse crescente por mudanças na legislação ITAR, algumas vezes abordadas aqui no blog, é exemplo dessa aparente mudança de paradigma. Quando Hillary Clinton, secretária de Estado dos EUA envia carta ao governo brasileiro dizendo que seu país propõe "transferência de tecnologia sem precedentes" no fornecimento de caças para a Força Aérea Brasileira, vê-se outro exemplo de aparente mudança.
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terça-feira, 4 de agosto de 2009

Salvaguardas tecnológicas entre Brasil e EUA

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O blog tem buscado acompanhar e analisar em detalhes tudo que acontece sobre a Alcântara Cyclone Space (ACS). Com certa frequência nos últimos tempos, surgem informações, muitas delas apenas nos bastidores, dando conta de avanços, dificuldades, decepções, entre outras notícias relacionadas à empreitada ucraniano-brasileira.

Como já foi abordado aqui no passado, um dos aspectos mais importantes para inserir a ACS como player do mercado comercial de lançamentos espaciais é a necessidade do país lançador, no caso o Brasil, celebrar um acordo de salvaguardas tecnológicas (AST) (ou outro instrumento equivalente) com os EUA, país de origem da maioria dos satélites e componentes utilizados com propósitos comerciais. E segundo apurou o blog com uma fonte no governo, isto está na pauta da Assessoria de Cooperação Internacional da Agência Espacial Brasileira (AEB) e do próprio Itamaraty. Inclusive, já teriam ocorrido contatos do governo brasileiro com a sua contraparte norte-americana.

O tema é assunto bastante delicado e que gerou grandes repercussões no início da atual década, sob o argumento dos críticos de que se trataria de violação à soberania brasileira. E ironicamente, muitos do que na época era críticos, por estarem na oposição, hoje na situação entendem a necessidade e relevância do AST para as chances comerciais da ACS. Em 2000, quando o AST com os EUA foi assinado (porém não ratificado pelo Congresso Nacional), as negociações foram bastante difíceis. Talvez uma nova negociação seja mais fácil. "Hoje, a situação política [entre Brasil e EUA] é outra", afirmou a fonte.

Curiosamente, ao mesmo tempo em que o AST Brasil - EUA promete voltar à mesa de discussões, ganha intensidade a pressão de grandes operadores de satélites comerciais por novas opções de lançadores, particularmente na China e Índia. Recente edição da publicação especializada "Space News" traz reportagem ("SES, Intelsat asking lawmakers to rethink launch ban on China, India") sobre a intenção das operadoras Intelsat e SES, apoiadas pela fabricante norte-americana de satélites Space Systems/Loral, de persuadir políticos norte-americanos para que permitam o lançamento de satélites com componentes fabricados nos EUA por foguetes indianos e/ou chineses.

O receio destas operadoras (e provavelmente de muitas outras) é baseado na possível saída da Sea Launch do mercado (ver a postagem "Sea Launch: uma análise"), hipótese em que restariam no mercado essencialmente apenas dois players, a europeia Arianespace (Ariane 5), e a russa ILS (Proton), resultando em grandes riscos políticos e operacionais. Naturalmente, existem também outros interesses, como o comercial, motivado pelos custos menores dos lançadores asiáticos (vejam a postagem "A face comercial da ITAR").

No campo não-comercial, o governo indiano já se adiantou. Em 20 de julho, Índia e EUA assinaram um AST que permitirá o lançamento pelo país asiático de satélites sem propósitos comerciais que tenham componentes de origem norte-americana. A Índia continua não tendo autorização para o lançamento de satélites com componentes norte-americanos com finalidades comerciais. Para ter esta permissão, é necessária a celebração de instrumento específico, denominado Acordo de Lançamentos Espaciais Comerciais (CSLA, sigla em inglês), mesmo ato que deverá ser assinado pelo Brasil, provavelmente em conjunto ou após o AST.
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sexta-feira, 17 de julho de 2009

Cooperação Brasil - EUA em propulsão

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A nova edição (nº 6) da revista Inovação em Pauta, mantida pela Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), do Ministério da Ciência e Tecnologia, lançada no início desta semana traz uma interessante reportagem sobre o desenvolvimento pelo Instituto de Estudos Avançados (IAEv/CTA), de nova tecnologia de propulsão baseada em energia de raios laser. Para acessá-la, clique aqui.

Um dos pontos mais interessantes desta iniciativa é a parceria com o Laboratório de Pesquisas da Força Aérea dos EUA (U.S. Air Force Research Laboratory), o que demonstra que em matéria de tecnologia espacial, os Estados Unidos não são simples sinônimos de ITAR (International Traffic in Arms Regulations).
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